Sabe, meu jovem leitor, o que diferencia a Editora Opera Graphica da maioria das casas publicadoras de quadrinhos no Brasil? O amor. Na EOG, gibis são feitos com gosto por quem gosta de gibis. Ali, os editores cultivam a arte quadrinizada com carinho, esmero e prazer, procurando, sobretudo, resgatar o que já se fez e ainda se faz de melhor no gênero.
Da calçada à fama
Pode-se dizer que a Opera Graphica nasceu na esquina da Alameda Lorena com a Rua Bela Cintra, na região dos Jardins da capital paulista. Ali, na calçada, uma banca de jornais começou a fazer história e ditar a moda. E logo se tornou ponto de encontro de gibimaníacos, quadrinhólogos, estudiosos e sonhadores. Carlos Mann era o proprietário e o anfitrião. Como a coisa cresceu e o espaço se tornou insuficiente, a pequena gibeteria foi transferida pela uma ainda modesta loja na Alameda Jaú, n.º 1998, onde nasceria o Comix Book Shop, hoje um dos mais importantes endereços de gibis do País. Dali, primeiro, saíram fanzines e algumas publicações isoladas. Até que Carlos Mann resolveu formar parceria com Franco de Rosa, um especialista na área, com larga folha de serviços prestados aos quadrinhos, como crítico, roteirista, editor e incentivador da arte seqüencial. Depois, foi só reunir uma equipe idealista e competente e colocar mãos à obra. Estava formada a Editora Opera Graphica, hoje sediada em Vinhedo, na Grande São Paulo, com sete anos de atividade. Roberto Guedes é o editor; Dario Chaves, o editor-assistente; André Hernandez, o editor de arte, coadjuvado por Celso Pimentel. A revisão fica por conta de René Ferri, a digitalização de imagens por Evandro Toquette, Marcio Aioki, Antônio Rodrigues e Andriana Cheganças. Cida Cândido é a assessora de imprensa.
Elenco de clássicos
É da Editora Opera Graphica a Coleção Opera King, composta, até aqui, de cinco edições, dedicadas aos clássicos Sobrinhos do Capitão (de Rudolph Dirks), Popeye (de E.C. Segar), Hagar, o Terrível (de Dik Browne), Pinduca (de Carl Anderson) e Recruta Zero (de Mort Walker). Os personagens distribuídos pelo King Features Syndicate originaram ainda a Coleção King Komix, com um nome diferente a cada número: além dos já referidos Hagar, Recruta Zero, Sobrinhos do Capitão e Popeye, tem Mandrake (de Lee Falk). E do mesmo Falk a editora oferece O Fantasma, um dos mais populares heróis dos comics, sucesso nas tiras de jornais e revistas desde 1936 (no momento, são dois os títulos em circulação: O Fantasma Gold e O Fantasma Magazine).
A Opera Graphica também tem brindado o público nacional com o melhor de Batman (Lendas do Cavaleiro das Trevas e Batman Ego Trip) e de Super-Homem (O Homem que Tinha Tudo), além de ter revivido a laureada série Vertigo, do selo DC Comics, dirigida a um público mais adulto, com roteiros e desenhos de grandes nomes das HQs norte-americana e inglesa, como Neil Gaiman, e de haver comemorado os 50 anos de aventuras de Tex (de Bonelli e Galleppini) no Brasil com um belo álbum especial (aqui já focalizado).
Para os puristas, que preferem a preservação das historietas na forma originalmente publicadas nos jornais, a editora reservou Stripmania, com histórias completas, em tiras, do Homem-Aranha (de Stan Lee e John Romita, sr.), do Príncipe Valente (de Hal Foster) e de Tarzan (de Russ Manning), cujo n.º 2 está chegando às bancas.
Além disso, a EOG teve a audácia de retomar a publicação do clássico dos clássicos, Príncipe Valente (de Harold Foster), no mesmo padrão de qualidade iniciado pela Editora Brasil-América, a EBAL, do saudoso Adolfo Aizen, agora no volume XVII. Trata-se, por certo, de uma iniciativa de risco, já que é um título de pouco apelo comercial. No entanto, aí está outra virtude da Opera Graphica: ela não parece preocupada com o sucesso imediato de seus produtos. Por isso, pouca importância tem dado à periodicidade das publicações. Sabe que o que é bom não tem idade nem envelhece e se manterá sempre na moda. Veja-se o exemplo de Spirit (de Will Eisner).
Prata da casa
Como se tudo o dito não bastasse, o grande mérito da Editora Opera Graphica tem sido restaurar a memória dos grandes nome (do presente e do passado) dos quadrinhos brasileiros. Graças às coleções Opera Brasil, Opera Arte e Opera Mundi, as novas gerações de leitores de gibis estão tendo a oportunidade de tomar conhecimento de Watson Portela, Mozart Couto, Emir Ribeiro, Flávio Colin, Júlio Shimamoto, Gedeone Malagola, Nico Rocco, Kasuhiko e Eugênio Colonnese, entre outros, através de bem-cuidados álbuns de tiragem limitada, devidamente autografados pelos autores.
O talento e a arte de Gedeone Malagola, Nico Rosso e Kazuhiki se fazem presentes em A Maldição do Lobisomem, de 1974. Gedeone foi um dos pioneiros dos gibis brasileiros, como roteirista, desenhista e editor. Em 40 anos de carreira, assinou mais 1,5 mil roteiros dos mais diversos gêneros. É também o pai dos super-heróis nacionais, entre os quais, Targo, Raio Negro, Homem-Lua e Homem-Mosca. Rosso, um italiano de Turim, chegou ao Brasil aos 24 anos de idade. Aqui, amadureceu a pena e se tornou uma legenda dos quadrinhos, particularmente nas histórias de terror. Era um mestre no pincel e no jogo de luz e sombra, que dificilmente será superado.
Emir Ribeiro criou a primeira super-heroína brasileira, a voluptosa Velta, em 1973, como parte de um tablóide escolar, na Paraíba, terra-natal do autor, então com apenas 15 anos de idade. Depois, levou-a para fanzines e publicações independentes. Agora, ela ganha uma merecida edição especial, de luxo.
De Eugênio Colonnese, um ítalo-argentino que, em 1964, acabou adotando o Brasil como pátria, duas preciosidades. A primeira é Mirza, de 1967, uma bela e sedutora vampira, considerada precursora de Vampirella (de James Warren e Frank Frazetta), que somente apareceria dois anos depois. A outra obra de Colonnese, que também se celebrizou como autor de uma rica galeria de portentosas figuras femininas, é A Arte Exuberante de Desenhar Mulheres. Essa faceta da obra do artista, aliás, está a merecer uma atenção especial, que prometo dar-lhe oportunamente, aqui neste mesmo “canal”.
Júlio Shimamoto é outro mestre do desenho, há mais de 50 anos em atividade, desde os velhos tempos do Capitão 7, super-herói brasileiro editado pela extinta Editora Outubro, de Miguel Penteado. Em 1986, aliado a Luiz Antônio Aguiar, Shima produziu Nos Tempos de Madame Satã, para a Editora Marco Zero, enfocando a trajetória do famoso travesti valentão do bairro boêmio da Lapa, no Rio. O mesmo personagem está nas páginas de Cassino, n.º 9 da Coleção Opera Brasil, que tem como pano de fundo o governo Dutra, logo após a II Grande Guerra.
Por fim, Flávio Colin, um dos mais importantes nomes das HQs nacionais, autor de O Anjo, Sepé Tiaraju e Vigilante Rodoviário e inúmeros álbuns memoráveis, incluindo Lampeão e A História de Curitiba. Com Filho do Urso e Outras Histórias, a Editora Opera Graphica presta uma significativa homenagem ao talentoso artista, que faleceu em agosto do ano passado. Dono de um traço personalíssimo e um defensor entusiasta do gibi brasileiro, Colin foi um exemplo de correção e dignidade, fiel até o fim a seus princípios pessoais e profissionais. Por isso, mais do que um simples álbum, a edição dedicada a Flávio Colin é um precioso documento histórico, que deve ser lido e guardado. Junto com a saudade que ele deixou no mundo dos qua-drinhos.
Vale advertir, por fim, que, como produtos diferenciados, poucos são os lançamentos da Opera Graphica pre-sentes nas bancas de jornais e livrarias, restringindo-se, em regra, aos pontos de venda do HQ Club. Em Curitiba, o leitor poderá encontrá-los na gibeteria Itiban (Av. Silva Jardim, 845). O que não tiver em estoque, o Chico ou a Mitie providenciarão de imediato.
Na próxima semana, se os deuses permitirem, mostraremos o que vem por aí, ou o que a Editora Opera Graphica está preparando para 2003.