Uma das práticas comuns em escolas é o estabelecimento de rótulos para a criança. Se ela não estiver dentro do padrão esperado, que se acomoda na carteira e não é muito crítica, corre o risco de ser vista como indisciplinada, e isso não ocorre somente na educação infantil. Aquelas que não se encaixam na expectativa às vezes são encaminhadas para que um profissional da área psicopedagógica as avalie. Esta é a experiência vivida pela psicopedagoga e especialista em psicodrama Sônia Maria de Oliveira Franzosi, que atua em clínica particular e ministra aulas em cursos de psicopedagogia.
Rotular crianças é uma atitude sem fundamento teórico. ?Quando os professores se orientam por esta postura é porque, talvez, receberam uma formação mais voltada para a ensinagem e menos para a aprendizagem. A educação de ensinagem se preocupa com o método, a didática, mas sem foco no aprender?, diz a psicopedagoga.
Uma das bases na qual a psicopedagoga diz se apoiar é a proposta de Paulo Freire, que toma como ponto de partida o ser que aprende, o educando. Ela explica que ?a diferença deste método é que foca a aprendizagem na realidade do aluno, no seu mundo, no seu universo vocabular, no desenvolvimento de sua capacidade crítica de sua própria situação?.
O outro alicerce é Jacob Lévy Moreno, que utiliza o psicodrama como recurso. Seu método ?colabora com a filosofia fenomenológico-existencial que orienta para que se olhe a situação em que se encontram os educandos sem preconceito, que se observe o que se vê e como isso repercute em si, buscando sempre uma fundamentação teórica para isso?, explicou Sônia.
Se o professor não recebeu uma formação voltada para a relação, o que ele pode fazer? Franzosi comenta que é importante que ?ele focalize a aprendizagem na relação, na dupla educativa professor-aluno e procure entender a importância de seu trabalho na formação do cidadão. Se ele compreender que a criança o vê como modelo, que pode, portanto, acrescentar a um modelo que a criança já teve na família, terá preocupação maior do que ministrar conteúdos, que também fazem parte, saberá acolher e ouvir e o conhecimento se constrói somando a relação de ambos?.
Primeiro passo, as crianças são encaminhadas para avaliação – Quando uma criança tem alguma dificuldade, é encaminhada para a psicopedagoga, como explica Sônia. ?Noto que diversas crianças que me foram apresentadas com distúrbios de aprendizagem ou indisciplinadas ou que não conseguem aprender e que foram avaliadas por mim, tinham dificuldades, mas não era verdade que não tinham potencial para aprender, ou que eram portadoras de um distúrbio de aprendizagem. Observo que muitas vezes, de tanto uma criança ouvir que tem dificuldade de aprender, que não consegue entender isso e aquilo, assume o rótulo. É necessário desenvolver com elas um trabalho pelo qual voltem a ter auto-estima e a acreditar que podem aprender?.
Segundo passo, a avaliação psicopedagógica – Depois que a escola encaminha e a família procura a psicopedagoga, conta Franzosi, ?faço a avaliação para ter elementos e chego a um parecer diagnóstico. A avaliação consta de um trabalho também com a escola, conhecer a realidade da escola, do professor, do aluno em sala de aula?.
Terceiro passo, a intervenção psicopedagógica – Se houver necessidade é realizada a intervenção psicopedagógica. Se não for, a psicopedagoga busca trabalhar com o professor, porque um só atinge inúmeras crianças. A psicopedagoga diz que ?as crianças buscam a relação com o professor. Elas querem isso e da parte da criança há a busca. Os professores acreditam que já fazem a parte deles, mas não existe um ensinar e um aprender. A aprendizagem só se dá na relação?.
Zélia Maria Bonamigo é jornalista, mestranda no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social pela UFPR, membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná.
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