A exposição inaugurada nesta terça-feira, 06, no Grand Palais, com a apresentação dos painéis Guerra e Paz, que o pintor brasileiro Cândido Portinari concebeu para ser exposta na sede das Nações Unidas, em Nova York, é fruto de cinco anos de trabalho coordenado pelo filho do artista, João Cândido, que acompanhou ontem em Paris os últimos detalhes da abertura da exposição. Guerre et Paix de Portinari – Un Chef-d’Oeuvre Brésilien Pour l’ONU (Guerra e Paz de Portinari – Uma obra-prima brasileira para a ONU, na tradução literal) gira em torno dos dois painéis de 14 metros de altura pintados entre 1952 e 1956, obras que denunciam a tragédia dos conflitos armados ainda à luz da 2.ª Guerra Mundial.
Em um dos pavilhões do Grand Palais, os dois colossos foram dispostos lado a lado, e confrontados por uma parede de espelhos gigante, que reflete o trabalho e cria uma sensação de onipresença das imagens de tempos de guerra e paz. Segundo a arquiteta carioca Virgínia Fienga, coordenadora de Museografia do Museu D’Orsay desde 2006 e cenarista da exposição, o objetivo é acentuar no visitante a sensação de grandiloquência do projeto de Portinari. “Minha ideia foi criar uma espécie de catedral para acentuar a monumentalidade da obra”, disse ela ao jornal O Estado de S.Paulo. Os painéis são interpostos por um grande telão também vertical no qual são exibidos os estudos que o pintor brasileiro realizava antes de passar ao ato da pintura.
Cada imagem na tela é acompanhada de um foco de luzes no painel, criando uma interação entre o trabalho pictorial e sua origem conceitual. “A proposta foi criar um diálogo poético entre os estudos e a obra de Portinari”, explicou Mauricio Moreira, diretor do projeto audiovisual do Estúdio Preto e Branco, que trabalhou com o Projeto Portinari na concepção da mostra de Paris.
Embora seja centrada nos dois painéis emblemáticos do pintor, a exposição também apresenta ao público as telas que deram origem ao mosaico de histórias da obra maior, como A Ciranda das Mulheres e as Crianças Que Brincam e Coral de Crianças, os dois derivados do painel Paz, e Mulheres Que Não Querem Ver e O Desespero, extratos do painel Guerra, parte de um total de 37 estudos em cartaz. Traz ainda um Catálogo Raisonné eletrônico com mais de 5 mil croquis e obras de Portinari apresentados em ordem cronológica.
O documentário, também monumental, é viabilizado por quatro projetores sincronizados que iluminam um segundo telão, em um apanhado de imagens sobre o trabalho do pintor com duração total de nove horas. Completam a mostra duas linhas do tempo, uma convencional, afixada no hall de entrada da exposição, e uma eletrônica, em forma de webdoc, na qual é possível navegar e conhecer detalhes da vida e da obra do artista.
A exposição custou um total de R$ 8,5 milhões, patrocinados pelo Banco do Brasil, Caixa, BNDES e Petrobrás, além dos grupos franceses Casino, GDF Suez e Alstom. A expectativa da direção do Grand Palais é de que cerca de 300 mil pessoas visitem a mostra, que fica em cartaz apenas um mês, antes de embarcar de volta a Nova York. Essa, aliás, é uma das razões pelas quais João Cândido confia no sucesso do projeto, a exposição é a maior já realizada em Paris desde a morte do mestre brasileiro e é também uma oportunidade única de apreciar os painéis, que na ONU ficam distantes do grande público. “É provável que esta seja a última vez que o público europeu terá a oportunidade de ver Guerra e Paz fora da sede das Nações Unidas”, avisa João Cândido.
A expectativa de sucesso da mostra joga para segundo plano uma negociação bem menos glamourosa para sua realização. Durante cinco anos, o governo brasileiro, a embaixada do Brasil e os organizadores do Projeto Portinari tentaram convencer o governo da França a liberar o Grand Palais para a exposição. Em setembro de 2013, em um contato direto com a ministra da Cultura da França, Aurélie Filippetti, a ministra da Cultura, Marta Suplicy, pressionou pela realização do evento, arrancando o sim.
Para o governo brasileiro, Portinari se encaixa na estratégia de reforço de seu soft power e na construção de uma nova imagem, mais refinada, do País no exterior. “Queremos ir além do samba e carnaval”, justificou Marta. “Nós não somos só isso, não é?” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.