A boa qualidade dos longas-metragens foi a característica mais marcante desta 6ª edição do Festival de Paulínia. Dos nove selecionados para a mostra competitiva, pelo menos oito vão do bom ao ótimo. Apenas um destoa, o documentário local Neblina, que, no entanto, está longe de ser irrelevante – apenas é equivocado quanto ao rumo escolhido.
Dos outros, pode-se dizer que compõem a mais interessante seleção de um festival brasileiro dos últimos anos. E todos inéditos, embora o critério de ineditismo não seja unanimidade entre curadores de festivais brasileiros. No exterior, entre os grandes festivais, é dogma de fé.
Os concorrentes da última noite – A História da Eternidade, de Camilo Cavalcante, e Infância, de Domingos Oliveira – colocam-se entre os destaques da mostra. O primeiro, na roda trágica da miséria, da crueldade e também da poesia no sertão devastado pela seca. O segundo, semiautobiográfico, refaz a memória dos verdes anos do futuro escritor, no mundo da aristocracia carioca dominado pela matriarca (Fernanda Montenegro, em interpretação gigantesca).
Esses últimos concorrentes já haviam sido precedidos por filmes de grande envergadura, como Sinfonia de Necrópole, de Juliana Rojas, Casa Grande, de Fellipe Barbosa, e Sangue Azul, de Lírio Ferreira. Assim como pelos muito interessantes Aprendi a Jogar com Você, de Murilo Salles, e o docudrama Castanha, de Davi Pretto. Mesmo o mais rotineiro Boa Sorte, de Carolina Jabor, tem seus méritos.
Com essa seleção, Paulínia consegue unir qualidade e diversidade. Nota-se nos filmes grande preocupação com o rigor formal, com a subordinação da linguagem cinematográfica àquilo que se deseja expressar. São projetos que vão do rigor da decupagem, como em História da Eternidade e Casa Grande, à criativa intuição cinematográfica de Lírio Ferreira em Sangue Azul. Para quem achava – com razão – que vivíamos um momento medíocre no cinema brasileiro, esses bons ventos que vêm de Paulínia são um alento.
Sabiamente, para efeitos de premiação, Paulínia não faz distinção entre ficção e documentário, “gêneros” cujas fronteiras estão sendo progressivamente abolidas. Sua separação faz menos sentido do que nunca. Como cada vez mais personagens da vida real estão interpretando a si mesmos, podem perfeitamente concorrer aos troféus de ator e atriz. Basta que os júris tenham a mente aberta para esta possibilidade.
Se os longas foram o ponto alto, os curtas decepcionaram. Sobram poucos a serem lembrados, como Jessy, de Paula Lice, Rodrigo Luna e Ronei Jorge, e O Clube, de Allan Ribeiro, interessantes imersões no universo do transformismo. Alguns quase chegam lá, como O Bom Comportamento, de Eva Randolph, ou Edifício Tatuapé Mahal, de Carolina Markowicz e Fernanda Salloum, mas se perdem ora na complexidade da proposta, ora no esgotamento da inspiração após início promissor. Fica a dúvida: má escolha ou safra ruim?
Por fim, Paulínia consegue um equilíbrio interessante ao optar pelo cinema autoral que consegue se comunicar com o público. Não cai no hermetismo nem em seu oposto, o populismo televisivo. Por outro lado, em sua tentativa de internacionalizar-se, Paulínia não encontrou rumo definido. Sobrecarregou a programação com pré-estreias sem outro eixo condutor entre os filmes que o de pertencerem, quase todos, a uma mesma distribuidora, a Imovision, homenageada no evento pelos seus 25 anos de existência.