Cora Coralina para além da imagem da senhorinha que escrevia poemas e preparava doces na casa às margens do Rio Vermelho, na cidade de Goiás. É isso o que pretende mostrar o filme Cora Coralina – Todas as Vidas, que terá sua primeira exibição neste sábado, 15, na terra natal da poeta, durante o Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (Fica). Claro que cena, no imaginário de todo brasileiro que conhece sua obra, estará retratada no longa. Afinal, este é um documentário poético, que mistura realidade e ficção, sobre a autora de Vintém de Cobre e que resgata os principais períodos de sua vida. Este, especificamente, será interpretado por Walderez de Barros.

continua após a publicidade

O filme dirigido por Renato Barbieri conta, ainda, com outras três atrizes que se revezam no papel de Cora. Camila Salles, a Camilinha, faz o papel de sua trisavó aos 5 anos. Maju de Souza é Cora aos 14 e Camila Márdila (premiada em Sundance), aos 21. Há ainda uma personagem mais etérea, nas palavras do diretor, que é protagonizada por Teresa Seiblitz.

Essa narrativa tecida pelas palavras de Cora se alterna com depoimentos de pessoas que a conheceram ou estudaram seu legado. Entre elas, Clóvis Carvalho Britto e Rita Elisa Seda, que publicaram pela Ideia & Letras, em 2009, Cora Coralina – Raízes de Aninha. O filme é inspirado livremente nesta biografia que já está em sua 4ª reimpressão.

Em uma terceira parte do filme, todas as atrizes que encarnaram Cora, exceto a criança, vão ao estúdio e leem trechos dos textos da autora. Neste caso, elas – e ainda Bete Goulart e Zezé Mota – não são mais personagens, mas elas próprias.

continua após a publicidade

E, por fim, Cora aparece aqui e ali em imagens de arquivos videográficos projetadas sobre paredes, para trabalhar a imagem poética, explica Barbieri, que já tinha feito cinco cinebiografias – de Monteiro Lobato e Mauricio de Sousa, inclusive – antes de aceitar o convite do produtor Marcio Curi.

Tudo começou em 2009, quando Curi recebeu a visita de Paulo Sérgio Bretas Salles, seu amigo e neto de Cora. “Ele me procurou porque sentia a necessidade de que alguém realizasse um filme mais completo, que retratasse sua vida e obra. Já haviam sido produzidos alguns bons curtas, mas ele sentia a necessidade de um filme que levantasse o véu que sempre encobriu a trajetória de Cora, antes de ser revelada ao Brasil pela famosa crônica de Carlos Drummond de Andrade.”

continua após a publicidade

Foi com esse texto publicado pelo poeta mineiro no Jornal do Brasil, em 1980, que ela ficou conhecida do grande público. Cora já estava com 91 anos e pôde aproveitar por pouco tempo sua fama meteórica. Morreu quase cinco anos depois sem imaginar, por exemplo, que teria um fã clube de 217 mil pessoas – entre os escritores brasileiros mais populares do Facebook, ela perde para Clarice Lispector e Caio Fernando Abreu e ganha de Drummond e Leminski.

E foi na época do texto de Drummond que Renato Barbieri ouviu sobre ela. “Comprei todos os seus três livros, visitei sua casa quando ela já tinha morrido. Encarei o convite para dirigir o filme como um presente”, conta. E ao aceitá-lo ampliou o conhecimento que tinha sobre a trajetória dela – é esse caminho que ele segue neste primeiro longa sobre a poeta.

“Poucos sabem que dos seus 95 anos, ela passou 45 em São Paulo”, comenta. Ou que ela começou a escrever muito cedo, que era engajada em causas sociais e ambientais, que vinha de uma família letrada, que vendeu livros para a José Olympio.

Regina Pessoa o ajudou no roteiro, que segue uma linha cronológica dos fatos, mas não dos poemas. As filmagens foram feitas na cidade de Goiás, Jaboticabal, Penápolis e Andradina, onde ela viveu. São Paulo ficou de fora porque já está muito diferente do período em que Cora passou por aqui.

A Tucumã fará a distribuição do filme, que não tem previsão exata de chegada aos cinemas – talvez em algum momento entre o fim deste ano e o primeiro semestre de 2016. A opção foi por apresentar o filme em festivais, antes. Há planos de exibi-lo na tevê mais para a frente.

Barbieri diz que vê em Cora uma figura acima do normal. “Ela é uma gigante. Rompeu barreiras, do machismo até. Ela é uma expressão da mulher moderna que saiu de casa e foi ao encontro do seu destino. Isso é muito atual.” Ele diz ainda que ela foi uma “bandeirante’ que deixou sua marca. “Entrevistei pessoas que a conheceram em locais de onde ela saiu há 70 anos e que falam dela como se tudo tivesse ocorrido anteontem. Cora foi uma mulher que esteve à frente do seu tempo e deixou sua marca por onde passou. Isso não é um clichê; é um fato. E o filme busca expressar isso com toda a poesia da Cora”, explica. Ele insiste em seu legado: “Ela fazia realmente a diferença. Foi profunda, ativista, não tinha preconceitos. Cora transitava com desenvoltura dos becos aos salões. Essas figuras são diferentes”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.