Há momentos que ficam gravados em nossa memória de tal maneira. Como diz Caetano Veloso na letra de uma de suas músicas: “Momentos intensos, momentos imensos, mentiras reais”. Ou até uma das personagens da peça que estou comentando: “Os momentos devem ser absorvidos sem oposição”.
É com esse intuito de eternizar esse momento que Fernando Cardoso aplica sua meticulosidade, habilidade e destreza, e dirige com genialidade “Porco Hurbano”, uma obra de notável beleza e plasticidade. Sem dúvida é um espetáculo teatral que nos vislumbra em todos os sentidos.
Baseada na obra de Guilherme Schwarz, narra a história do homem, de forma nada convencional. A trama é uma grande metáfora da condição humana; desde a antigüidade o homem vive em sociedade, aprende modos e manias, mas com o passar do tempo o ser humano vem perdendo sua originalidade. A falta de controle sobre si, a perda de seus sentimentos.
O ser humano está perdendo sua essência, e vem se tornando um ser mecanizado, não conseguindo revelar seus sentimentos, escondendo-se atrás de uma muralha que nem consegue mais enxergar o mundo. Não tem controle sobre si, perde a sua e adquire diversas personalidades que são impostas pelo meio. Não tem domínio, não julga o certo e o errado.
O homem está num verdadeiro jogo, e lança mão dos mais variados estratagemas para encobrir seus reais interesses. Daí emergem todas as neuroses, psicoses, paranóias, hipocrisias, cinismos ou outras coisas parecidas que fazem do homem contemporâneo um ser doente. Todavia, apesar de grave, a doença do homem não é um mal incurável. O caminho para atingir a cura pode ser em aproveitar seus verdadeiros momentos. E assim, desfrutando de um momento encantado podemos assistir e mergulhar experimentalmente na proposta da Serafim Cia. Teatral; e teremos poesia e lirismo mesmo que cercados de caos e violência. Dessa forma poderemos elevar o espírito humano e sermos mais que urbanos.
Momentos desfrutáveis estão presentes em toda a peça, especialmente na seqüência de abertura. O fogo, a chama viva que arde dentro de cada ser humano, ou até como símbolo de racionalidade perante as outras espécies.
Em meio ao fogo, fundem-se sons, e encantadoramente entra Danúbio Azul de Strauss, que é interrompida por ruídos e começa trecho da 9.” Sinfonia de Beethoven, que subitamente se transforma numa batida tecno, dessas encontradas em meio às “raves” espalhadas por aí, e culmina numa explosão.
É de arrepiar! Sem dúvida essa é uma seqüência marcante e extraordinária a que podemos presenciar. Quem desconhece, precisa conferir a magia do teatro.
É uma peça imperdível, que podemos ver e rever, sem jamais cansar.
Porco Hurbano
Em cartaz no Teatro Mini-Guaíra. Até 13 de outubro. De quinta a sábado às 21 horas e domingos às 19 horas. Ingressos a R$ 10,00 e R$ 5,00 (estudantes, bônus e maiores de 65 anos).
Direção e produção: Orlando Riguetto. Direção adjunta: Ana Maria Moreschi. Direção geral: Fernando Cardoso. Elenco: Leandra Oliveira, Flavia Strongolli, Maria Helena Pereira, Caue Matias, Gilmar de Padua, Orlando Riguetto e Fernando Cardoso.
