A música lírica tem ocupado bastante o compositor Ronaldo Miranda. Autor de obras como Capitu e A Tempestade, ele se prepara para estrear, em novembro, sua nova ópera – O Menino e a Liberdade, com libreto de Jorge Coli baseado em texto de Paulo Bonfim. Antes, porém, uma outra faceta de sua produção ganha espaço com o lançamento de um disco em que a pianista Patrícia Bretas registra sua obra completa para piano solo – reivindicando para ela papel protagonista em sua produção. “Ronaldo Miranda é um pianista por excelência e sua criação para o instrumento precisa ser vista como referência. É um brasileiro que escreve com solidez, vigor, ritmo marcado, e faz uso da linguagem que mais lhe apraz no momento, sem compromissos com movimentos temporários”, diz.
A ideia do álbum, que será lançado sábado na Sala São Paulo, surgiu em conjunto com o próprio compositor, conta a pianista, carioca que divide o tempo entre o Brasil e a Europa, com foco na composição contemporânea. “Este era um projeto antigo do Ronaldo, porque, apesar da absoluta maioria dos pianistas brasileiros terem obras suas no repertório, ainda não havia um registro inteiramente dedicado à sua produção para teclado.”
O disco tem 11 obras. A mais antiga é a Suíte n.º 3, de 1973, recriação livre da suíte barroca, escrita quando Miranda era aluno de composição na UFRJ. As mais recentes são de 2005: Valsa Só e Prelúdio e Fuga, revisão de uma peça escrita aos 17 anos de idade pelo autor. Entre esses dois momentos, o repertório evoca uma diversidade grande de inspiração. Prólogo, Discurso e Reflexão, de 1980, faz parte da fase atonal de Miranda, assim como a Toccata; Estrela Brilhante o coloca em contato com o folclore brasileiro; já Tango evoca o universo musical de autores como Bela Bartók e Astor Piazzolla. “Ele vai do estilo ‘modinheiro’ da Valsa Só ou das Variações Sérias sobre Anacleto ao politonalismo de Tango e Estrela Brilhante, passando por obras atonais e outras neonacionalistas, caso do Frevo, por exemplo, e livre, como as Variações Asorovarc”, diz Patrícia, chamando atenção para a variedade da escrita do compositor – e para o fato de que, de alguma forma, sua obra para piano serve de microcosmos segundo o qual é possível acompanhar as principais transformações pelas quais passou sua carreira.
Mais do que isso, Patrícia acredita que há uma ligação especial entre a sensibilidade do compositor e o instrumento. “Em meio a encomendas de óperas, transcrições próprias, peça para violoncelo e orquestra sinfônica, Ronaldo é capaz de aprontar uma obra da envergadura de uma primeira balada de Chopin ou de uma Fantasia Op. 49, também de Chopin, e em menos de um mês estar com ambas as peças prontas nos dedos, e na memória. Isso diz muito sobre o compositor e sobre sua relação com um instrumento tão complexo. Com sua destreza técnica e interpretativa, ele sabe escrever o que é possível ser realizado, mesmo que em determinados momentos sua linguagem pareça inatingível, no limite do inexequível. Mas tudo é tão bem pensado e acabado que a música aflora à medida que se estuda melhor a peça, e as mãos acabam por realizar o que antes parecia impensável.”
PATRÍCIA BRETAS – Sala São Paulo. Sala do Coro. Praça Júlio Prestes, 16, Santa Cecília, 3337-2719. Sáb., às 11h (concerto e lançamento do CD). Grátis.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.