Para um setor que no Brasil já está majoritariamente atrelado às leis de incentivo, fundos e editais públicos para levantar a verba para seus projetos, falar em um modelo de cinema como negócio independente soa, a priori, como investimento arriscado.
Afinal, são raros os casos de filmes nacionais que, se feitos com investimento direto, dariam aos produtores o retorno financeiro necessário para cobrir os gastos e, em seguida, gerar lucro.
Em geral, somente casos como as mais recentes comédias e filmes como “Tropa de Elite” se pagariam na bilheteria. “Mas Angelo (Salvetti, produtor de ‘Isolados’) diz que pegar dinheiro para fazer um filme e não ter de devolvê-lo não é um negócio. Negócio é quando se empresta o dinheiro, investe e lucra”, analisa o diretor Tomás Portella, de “Isolados”, que atualmente filma a comédia “Desculpe o Transtorno”.
“Claro que as leis de incentivo e os mecanismos de financiamento públicos são necessários, pois há projetos que precisam e merecem o apoio, como os filmes autorais”, continua Portella. “Mas há uma série de filmes que podem ser bom negócio e não há motivo para deixar de tratá-los como negócio. A questão é encontrar alguém disposto a investir neles”, completa Salvetti, que, entre seus próximos longas, tem projetos híbridos: com verba incentivada e investimentos direto. Estão em desenvolvimento os longas “Meu Ex-Imaginário”, “A Vida Sexual da Mulher Feia”, “Não Aprendi Dizer Adeus”, a história do cantor Leonardo, uma cinebiografia do Chacrinha, entre outros. “Cada filme pede um modelo”, diz Salvetti. “O ideal são formas híbridas, pois, graças às políticas de incentivo público, há hoje uma geração de profissionais bem formados e preparados para trabalhar em produções independentes”, observa Vítor Mafra, diretor de “Lascados”.
Para “Isolados”, cujo orçamento geral gira em torno de R$ 5 milhões, a ideia sempre foi produzir de forma independente. “Tive a sorte de encontrar a Media Bridge. Filmamos sem um centavo de dinheiro público e somente para a finalização ganhamos um concurso do Fundo Setorial, mas esta verba ainda não entrou e estamos lançando também com recursos próprios, em 200 salas”, acrescenta Portella.
Já para a equipe de “Lascados”, pensar em um modelo de negócios independente, em que cada investidor tivesse uma cota do projeto, foi a única solução. “Temos aprovação para captar verba por meio das leis de incentivo, mas ninguém se interessou. Como esta é uma história que pedia agilidade, decidi apostar no financiamento direto”, explica o produtor Marcelo Braga, cujo filme custou em torno de R$ 2 milhões. “Apesar de muito mais modesto que outras grandes comédias que utilizam verba pública e têm chegado ao mercado em centenas de salas, Lascados tem grande potencial de público”, acrescenta ele. “Estreamos em uma entressafra de blockbusters, só na rede Cinemark, pois nenhuma distribuidora se interessou e quem está cuidando da distribuição sou eu”, revela Braga, que lança o longa em quase 70 salas.
Outra tática dos dois filmes é apostar em estratégias paralelas, como divulgação nas redes sociais, ações promocionais em empresas como academias de ginástica, escolas etc. “Isolados” ganhou um game interativo.
Se em ambos os casos o potencial comercial foi decisivo para que os investidores apostassem na ideia, há projetos em que, exatamente pelo caráter experimental, a saída é a produção independente. É o caso dos filmes da Cavi Filmes, de Cavi Borges, que já produziu mais de 10 longas de ficção e 20 documentários, além de dezenas de curtas. Nesta semana, ele apresenta sua mais nova empreitada no Festival de Brasília, “Pingo D’Água”, de Taciano Valério, em competição oficial.
“Nossos projetos, por não terem caráter comercial, têm dificuldade de captar verba e vencer editais. Encontramos um modelo próprio, que não depende de editais, do governo, mas de parceiros. São todos muito econômicos”, explica Cavi, que também finaliza seis longas e lança “Cidade de Deus – 10 anos Depois”. “É nosso maior orçamento: R$ 200 mil”, conta o produtor, que nesta semana ministra um curso sobre novas formas de financiamento colaborativo. “Não só crowdfunding, mas parcerias com profissionais, que viram sócios, empresas, canais de TV, como Canal Brasil, produtoras de publicidade, que são coprodutoras. Sejam filmes comerciais ou autorais, o futuro é mesclar estratégias”, conclui Cavi. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.