Os braços cortam o ar, como se regessem uma orquestra, enquanto o maestro Rafael Frühbeck de Burgos cantarola, movimento a movimento, os principais temas e melodias da “Nona Sinfonia” de Beethoven. Ele então, reclinando-se na poltrona de seu camarim na Sala São Paulo, abre um sorriso: “Não lhe parece espantoso que a música mais conhecida e repleta de simbolismos de toda a história seja de um compositor erudito?”

continua após a publicidade

Nascido na Espanha, mas formado na Alemanha, Frühbeck de Burgos – aos 78 anos e tido por parte da crítica como a síntese da tradição germânica com o calor da interpretação latina – chegou na segunda-feira a São Paulo. A partir de hoje, rege a célebre obra de Beethoven à frente da Sinfônica do Estado, em concertos que marcam a abertura da temporada da orquestra, com ingressos esgotados. Antes, em cada apresentação, toca a “Fanfarra” escrita pelo brasileiro Edino Krieger sobre temas do “Hino Nacional Brasileiro”.

É difícil, diz o maestro, comentar uma obra como a Sinfonia n.º 9, da qual já se falou tanto – e com enfoques tão variados. “Eu prefiro lembrar uma história”, começa. “Hoje é tradição tocar a Nona na noite de ano-novo, mas poucos sabem como isso começou. Foi na virada do século 19 para o 20. Trabalhadores em Leipzig queriam entrar em greve, descontentes com o contexto em que viviam. Mas protestos, naquela época, não eram tão naturais como hoje. E o maestro Arthur Nikisch encontrou uma maneira de dar voz a esses trabalhadores. Programou a sinfonia de Beethoven para o dia 31 de dezembro e formou com eles o coro que entoa o texto de Schiller, pedindo igualdade entre os homens, no final da obra. Foi a maneira encontrada por eles para protestar.”

A história dá a pista para uma possível explicação acerca da importância da obra – exatamente a sua mensagem de alegria e igualdade entre os homens, uma realidade que, ainda distante, sobrevive em forma de utopia e, assim, não para de dialogar com o ser humano, época após época. O tema já aparecera em outras obras do compositor. Isso faz da Nona uma espécie de síntese de seu trabalho? “Não acredito nisso”, diz o maestro. “Para mim, ela é como um mundo à parte. O primeiro movimento traz essa proposta temática interessante; o segundo é quase demoníaco em seu heroísmo; o terceiro, um trabalho melódico glorioso; e então, o quarto movimento, que se difere dos outros e sugere que algo novo é necessário.” A melodia do último movimento, explica, aparecera pela primeira vez na imaginação musical de Beethoven 30 anos antes da Nona, estreada em 1824. “É como se fosse preciso todo esse tempo para que ele pudesse encontrar a maneira ideal de colocá-la no papel. Isso é fascinante.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

continua após a publicidade

Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo – Sala São Paulo (Pça. Júlio Prestes, 16). Tel. (011) 3223-3966. De hoje a dom. Ingressos esgotados.