I
Músculos de pantera, bronze e aço:
o movimento ágil do antílope
sobre o verde retângulo,
a savana.
O lento gesto lúdico, a harmonia
do corpo arremessado
para a frente
com um dardo de ébano
e esperança.
II
O mistério de um passe
na grande área:
matemático, simples,
indizível.
A fuga inesperada pelo flanco
do inimigo atônito,
perplexo.
III
A finta transparente, o drible curto:
um bailado de lentas filigranas,
sutil coreografia
desenhada
com mágicas volúpias do estranho
poliedro de faces incontáveis
que se dá e se esquiva
e se transforma
num pássaro redondo, fugitivo
esférico libero de gaiola
de cristal.
IV
O chute exato, límpido, perfeito. E após
a rota peregrina, logo após
a órbita elíptica, o gol,
o gol inverossímil:
O minúsculo astro beija as redes,
iluminando o estádio feito
um grito colossal.
V
O soco irretocável
contra o espaço enorme.
O riso claro, nítido, translúcido.
O olhar jorrando luz
inexprimível.
VI
É findo o jogo. Epílogo: florescem
no minifúndio calmo do gramado,
os lírios incorpóreos
da saudade.
(Depois da sua lida inigualável,
o gênio dos estádios
descansa, finalmente. Talvez durma
sonhando a oitava arte,
o futebol).
João Manuel Simões é escritor, membro da Academia Paranaense de Letras.