Obra de Erika Verzutti destaca o sensorial

Na faculdade de desenho industrial no Mackenzie, aos 18 anos, Erika Verzutti e as colegas pegavam o roteiro de exposições da revista Veja, como conta, e iam visitar qualquer opção em cartaz em São Paulo. Nessa época, vivia uma angústia que classifica como “coisa de classe média”: “Olhava para a arte e não sabia o que era”. “A paixão e a disposição que tinha de olhar para uma escultura de um nu meio polido de um autor desconhecido era a mesma de ver uma obra do Daniel Senise”, afirma a paulistana, hoje com 43 anos. “Isso de ficar só no sensível”, como define, é o que ela tenta reproduzir, enfim, em suas criações como artista.

À primeira vista, as esculturas de Erika Verzutti podem parecer corpos estranhos. Em uma breve descrição, frutas, como jacas e bananas, e legumes, por exemplo, são transpostos para o bronze ou para o cimento integrando composições de uma ação escultórica que, atualmente, destaca-se em exposições em cartaz nos EUA e na Suíça. “Para além de representar, as esculturas de Erika Verzutti dão forma a sensações e fantasias – querem ser e fazer delícias e horrores”, escreve José Augusto Ribeiro no texto Um Bicho de Sete Cabeças, que abre o livro dedicado à artista, lançado recentemente pela editora Cobogó. Resume o crítico que a obra da paulistana “envolve humor, beleza, erotismo, estranhamento e violência, a uma só vez”.

“Trabalho no território da falta de informação”, afirma a artista, que recusa relacionar sua produção ao terreno da ironia. Citações (“escancaradas”) da história da arte – como remissões às esculturas surrealistas de Maria Martins (1894-1973), às formas das figuras antropofágicas dos quadros de Tarsila do Amaral (1886-1973) ou a trabalhos do escultor britânico Henry Moore (1898-1986). E ela também faz referências a clichês do campo artístico – com a incorporação de pincéis e paletas, por exemplo, em suas composições escultóricas – são sua maneira de jogar com o “cômico”, o “superficial” , a “devoção” e a “livre associação”.

As criações de Erika Verzutti podem ter um caráter mais figurativo em alguns momentos, em outros, mais abstratos – incursões geométricas -, ou até remeter a uma ancestralidade. “Um desejo mais primitivo que seja, de formas mais brutas, mais ásperas, é uma maneira de lidar hoje com a imagem contemporânea”, comenta.

“Acho que tem mais graça olhar para uma superfície terrosa agora do que teria nos anos 1980. É um ciclo que a gente vive, uma necessidade física. Gosto de pensar que as coisas se processam mais sensorialmente”, completa. O percurso mais recente de seu trabalho pode ser contemplado na edição da Cobogó.

Aceitação

No sábado, 19, a artista encerrou uma mostra na Galerie Peter Kilchmann de Zurique, mas ela participa, até novembro, de uma exibição coletiva no Langmatt, em Baden, também na Suíça. Já nos Estados Unidos, o Tang Teaching Museum, instituição universitária em Saratoga Springs, cidade do Estado de Nova York, acaba de inaugurar uma exposição da brasileira com conjunto de obras realizadas em 2013.

“É minha primeira individual em museu”, diz Erika, considerando que a “aceitação de público, crítica e mercado” de seu trabalho ocorreu, de fato, a partir de 2011, apesar de ela ter despontado no circuito na década de 1990, enquanto cursava a Goldsmiths College de Londres.

“Os trabalhos de Erika Verzutti, imbuídos de um sentido de ritual misterioso, geralmente centram atenção para formas e ciclos encontrados na natureza”, explica o texto de apresentação da mostra no Tang, até 16 de novembro. As peças reunidas na instituição norte-americana são criadas com pedras, argila, concreto e bronze, entre outros materiais, e ficam expostas no chão e nas paredes (neste caso, já indicando uma vontade de adentrar no campo da pintura-escultura). Fizeram também parte de uma coletiva, no ano passado, no Carnegie Museum de Pittsburgh.

Para completar o “tour” americano, duas de suas esculturas, Venus on Fire (2013) e Painted Lady (2012), estão na exposição Sob o Mesmo Sol: Arte da América Latina Hoje, em cartaz até 1.º de outubro no Guggenheim de Nova York (que as adquiriu). A mostra, com obras de outros brasileiros, vai itinerar em 2015 para o Museu de Arte Moderna de São Paulo.

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