São Paulo – A primeira impressão que desperta O Último Samurai, a grande estréia de hoje nos cinemas, é que se trata de um filme de aventuras para adultos, embora não privativo destes.
Tom Cruise, diga-se, está muito bem no papel de Nathan Algren, capitão que serviu na 7.ª Cavalaria sob as ordens do general Custer, aquele que dizia que índio bom é índio morto. Algren lutou, conviveu com o horror e saiu machucado da guerra. Tornou-se alcoólatra. Seu conhecimento da arte militar encontra emprego numa luta no outro lado do mundo, o Japão.
Katsumoto (Ken Watanabe) é o líder samurai contra o qual as forças de modernização irão lutar. Algren luta contra Katsumoto. São inimigos, a princípio. Depois, o americano é capturado pelo japonês, e a amizade nasce entre os dois. É uma história de amizade viril, no velho estilo do Oeste americano, mas ambientada no Japão dos samurais. Funciona.
O filme é, à sua maneira, crítico da modernização, ou do que esta implica em termos de desumanização das relações humanas. O ocidental é um desgarrado da civilização. Encontrou na anestesia pelo álcool uma forma de sobrevivência. Quando entrar em contato com outra cultura, poderá humanizar-se outra vez. À custa de muito e muito sangue e também à custa de uma renúncia a seus valores – que aliás, àquela altura, já estavam bem desgastados.
Não falta beleza ao filme que, diz o diretor Edward Zwick, seria inspirado no clássico de Akira Kurosawa, Os Sete Samurais. Fica no limite da descaracterização, mas toma algumas precauções, como o respeito à linguagem. Precisa, claro, de interlocutores que falem em inglês com Cruise, mas pelo menos os nativos falam japonês entre si, o que já não é pouco em produção hollywoodiana.
Mais interessante é a “suavização” dos traços orientais da banda “boa” do filme, enquanto os vilões, estes sim, parecem verdadeiros orientais. Tudo é sutil, mas muito perceptível.
Cacoetes
Ainda assim, mesmo com o traço da diversidade suavizado, O Último Samurai apresenta qualidades. É claro que ao longo da história iremos encontrando os cacoetes de uma linguagem cinematográfica padrão: alguns vilões bem demarcados, uso melodramático da trilha sonora, situações implausíveis. O guerreiro alcoólatra, egresso da Guerra Civil, deveria parecer um farrapo humano. Mas Cruise paira na tela em excelente forma, e, apesar das cicatrizes e escoriações (ou até por causa delas), o público feminino não terá do que se queixar. Enfim, é um filme do sistema, investiu-se nele, tem um astro famosíssimo e não se brinca impunemente com essas coisas.
Se essas limitações existem, seria mesquinho apegar-se a elas. As cenas de lutas e batalhas, por exemplo, parecem muito convincentes. Devam o que deverem à tecnologia, nada têm do artificialismo digital das de O Tigre e o Dragão ou O Senhor dos Anéis. Parecem travadas entre seres humanos, gente de carne e osso, que sofre, sente medo, sente dor, sangra e morre. De certa forma, essas cenas são um alívio diante de tanta fantasia adolescente que tem pintado nas telas ultimamente.
