A dentista Claudia Sousa, de 63 anos, levava cerca de 10 minutos para ir de casa ao consultório, no Rio, e de repente o trajeto passou a durar 40 minutos. Leitora de livros físicos e digitais, ela nunca foi simpática à ideia de ouvir um audiobook. Achava que não ia funcionar para ela, que tem uma memória mais visual. No meio de um congestionamento, porém, resolveu comprar um título. Escolheu Me Poupe!, autoajuda financeira best-seller de Nathalia Arcuri, narrado pela própria autora – um livro que Claudia não compraria na versão tradicional. “Adorei, parecia que ela estava sentada ao meu lado.”
Em três meses, ela já ouviu cinco – cinco livros a mais do que teria lido, já que não substituiu a leitura tradicional antes de dormir por este novo jeito de ler. “O que salvou, literalmente, minha saúde física, mental e emocional foi ouvir os livros. Se as pessoas estivessem ouvindo livros no trânsito, não buzinariam tanto”, conta ao ‘Estado’.
A aposta dos fornecedores de conteúdo é mesmo no trânsito – no tempo em que as pessoas passam no carro, metrô e ônibus. Uma pesquisa feita pelo Estado com leitores em seu portal mostrou que a maioria (32,4%) ouve música no trajeto entre a casa e o trabalho. A leitura é a atividade mais frequente para 30% dos que responderam à pesquisa e 15% deles disseram que não fazem nada. Quando questionados se ouvir um audiobook seria uma boa opção de entretenimento durante os deslocamentos, 54% responderam que sim. E 60% disseram acreditar que audiolivros podem aproximá-los da literatura.
Profissionais do mercado editorial apostam na conquista de novos leitores. “O audiobook tem um potencial não só com o público leitor, mas também com aquele que não é leitor, mas que está acostumado ao streaming, ao podcast, por exemplo. Um levantamento que fizemos recentemente, com dados do TGI/IBOPE, sobre a propensão e o interesse em ouvir conteúdos em áudio no Brasil mostrou que cerca de 11% da população consome ou está propensa a consumir conteúdos em áudio e 60% das pessoas que consomem video-on-demand estão propensas a consumir conteúdo de áudio entretenimento”, explica André Palme, gerente da Storytel.
Camila Cabete, da Kobo, também acredita no audiolivro como um aliado na luta por leitores. “Mas mais do que isso: audiolivro é uma forma de entretenimento, e o consumidor vem em busca de boas produções e boas locuções. Vejo o produto como um concorrente direto dos aplicativos de streaming de vídeo.”
O editor Tomás da Veiga Pereira, da Sextante, que integra a Auti Books, acredita “profundamente” no formato, mas é realista. “Nada vai acontecer do dia para a noite, pois é uma novidade para 99,9% das pessoas, mas vai crescer e revolucionar o acesso dos livros no Brasil entre 5 e 10 anos.”
Comparando o primeiro semestre de 2018 com o de 2019, a distribuidora Bookwire registrou 74% de crescimento em vendas. “Os e-books ainda estão em explosivo crescimento no Brasil, mas, avaliando os primeiros números do mercado de audiolivro, ele aparentemente vai ser maior do que o de livro digital”, diz Marcelo Gioia, da Bookwire.
Há dois modelos de negócios: a venda tradicional e a assinatura (veja no box). A produção é cara (entre R$ 1.500 e R$ 2 mil a hora finalizada, podendo ser mais se o narrador for uma celebridade), e um audiolivro acaba custando só um pouco menos do que o físico.
O consultor Carlo Carrenho, que prepara a chegada da editora sueca World Audio ao País, acredita que alguns gêneros podem funcionar melhor do que outros em áudio. “Minha intuição é que, além da ficção comercial, religiosos, autoajuda, eróticos, romances femininos e obras comerciais de história vão funcionar bem.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.