Atualmente costuma-se achar ousadas as abordagens a artistas e celebridades do Repórter Vesgo, personagem de Rodrigo Scarpa no Pânico na TV. Mas, de fato, na tevê, nada se inventa. No início dos anos 80s, ainda na época da ditadura militar, um tal Ernesto Varela desconcertava políticos e autoridades com perguntas das mais incisivas. "Sr. Maluf, é verdade que o senhor é ladrão e corrupto?", indagou certa vez o repórter ao político paulistano. Pois Ernesto Varela, criação do ator e jornalista Marcelo Tas, está de volta.

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Por ora, o personagem pode ser visto no teatro com a peça Como chegamos aqui? A História do Brasil Segundo Ernesto Varela. Empolgado com a temporada no Rio, que vai até 18 de dezembro, o ator acha que ainda não é hora de o personagem voltar à televisão. "Por enquanto não. Eu nunca usei uma mídia que me deixasse tão feliz como o teatro, que me obriga a estar pronto para receber a resposta na hora e responder também", justifica.

 O repórter Ernesto Varela é, na verdade, uma criação conjunta de uma turma de amigos que, em 1982, resolveu se reunir para trabalhar com audiovisual. Desta reunião surgiu a Olhar Eletrônico, produtora que, além de Marcelo Tas, incluía gente como os diretores Fernando Meirelles e Paulo Morelli, que hoje comandam a O2 Filmes. O inusitado é que o personagem foi criado porque, no grupo, ninguém queria aparecer diante da câmara. Sobrou para Tas, que afinal, era o ator da turma. "A gente não sabia fazer direito, por isso inventou o personagem. Tudo era uma tentativa de descobrir um jeito de fazer telejornalismo", revela.

 O experimentalismo deu certo. Aos poucos, Ernesto Varela foi se tornando nome certo nas entrevistas coletivas e coberturas políticas do país. O trabalho independente da equipe da Olhar Eletrônico acabou despertando o interesse de emissoras como a TV Gazeta de São Paulo, que abriu espaço para as investidas de Marcelo no programa Ernesto Varela, o Repórter. Com uma maior projeção, Varela chegou a fazer reportagens especiais, como coberturas de Copa do Mundo. Mais tarde, fez um programa na MTV, Netos do Amaral, apresentou o Vídeo Show, quando ainda era semanal, e fez participações no Casseta e Planeta Urgente, da Globo. "O acesso à mídia foi lento. Nós éramos vistos com desconfiança, como um bando de malucos. Mas aí nós ganhamos alguns prêmios e o interesse começou a crescer", conta.

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 Com o término do programa de reportagens Netos do Amaral, da MTV, no início da década de 90, as aparições de Ernesto Varela se tornaram mais escassas. Foi a senha para Marcelo Tas se dedicar a outras produções. Nesse período, o ator interpretou tipos como o VJ "cyberpunk tupiniquim" Bob Mac Jack, na MTV, e o Professor Tibúrcio, do seriado infantil Castelo Rá-Tim-Bum, da TVE Brasil. Mesmo com o aparente sumiço de Ernesto Varela, Marcelo Tas garante que o personagem nunca saiu de cena. "Eu nunca parei de fazer o Varela. Ele é um personagem que sempre me acompanha e é uma referência muito forte do meu trabalho", observa.

 Enquanto não volta à telinha, Ernesto Varela pode ser visto no teatro em uma espécie de retrospectiva de seus melhores momentos. Na peça, Marcelo Tas se utiliza de um telão, onde exibe algumas das situações marcantes da trajetória de seu personagem. Entre elas, uma entrevista com o ex-deputado e ex-presidente da CBF – Confederação Brasileira de Futebol Nabi Abi Chedid, durante a Copa de 1986, no México. "O senhor usa o futebol para se promover politicamente?", perguntou o repórter. A reação irada do dirigente só não terminou em agressão porque, ao contrário do Repórter Vesgo, que volta e meia leva uns "sopapos", Marcelo Tas era precavido. "Eu sempre tive operadores de câmara muito fortes. Isso, de alguma maneira, intimidava quem quisesse quebrar o pau com a gente", diverte-se o ator que, depois da temporada carioca, pretende encenar Como chegamos aqui? A História do Brasil segundo Ernesto Varela em São Paulo a partir de março.

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