Merchandising em novela brasileira acontece desde os tempos de Beto Rockfeller, em 1968, na extinta Tupi. Na época, o protagonista vivido por Luiz Gustavo ressaltava as qualidades do anti-emético Engov, bastante indicado para quem entornava uísque demais – o uísque alheio, no caso do “bicão” Beto. Na verdade, o ator ganhava Cr$ 3 mil toda vez que pronunciava o nome do comprimido, sem a emissora saber. A “armação” só foi descoberta porque Luiz Gustavo se empolgou e falou 35 vezes a palavra Engov em uma cena. Atualmente, seria impossível tal “façanha”. As emissoras têm um departamento específico só para tratar de ações de merchandising. Ou seja: um produto só entra na produção após cumprir diversas etapas.
Tudo começa quando o autor entrega a sinopse para a emissora. Uma cópia vai para o diretor e outra para o departamento comercial. Com isso, começa-se a pensar no elenco e quais produtos que teriam o perfil para aparecer em merchandising na trama. Para dar tempo para os anunciantes avaliarem o desempenho do programa na audiência, geralmente os produtos só começam a aparecer após o 40º capítulo das novelas. Existe ainda uma equipe de roteiristas em contato com a produção das novelas para saber quais produtos podem se encaixar melhor nas cenas que serão gravadas.
Mulheres Apaixonadas já é o maior sucesso em termos de merchandising na Globo. A novela teve mais de 50 ações publicitárias em pouco mais de 140 capítulos e tem até uma personagem, a Ana, de Regina Braga, que é consultora dos produtos da Natura. Para o anunciante, o preço do merchandising sai até mais barato do que um comercial de 30 segundos no horário da novela das oito, que custa uma média de R$ 400 mil entre produção e veiculação. Já o preço de cada ação, também de 30 segundos, sai aproximadamente por R$ 500 mil.
Silêncio
São poucos os atores, no entanto, que se dispõem a falar sobre o assunto. Na verdade, os profissionais já consagrados na área ganham bem mais do que os iniciantes. O problema é que nem todos acham correto, mesmo ganhando um cachê, fazer publicidade na pele de seus personagens. Um deles é o ator Marcello Antony, que vive o arquiteto Sérgio em Mulheres Apaixonadas. Camila Pitanga, apesar de ter feito uma ação para o Banco Itaú, não quer nem tocar no assunto. “Prefiro não falar o que acho verdadeiramente sobre ação de merchandising. Me tira dessa”, pede. Já os atores mais novos arriscam palpites. “Faço sem problemas, mas não gosto quando parece falso demais”, diz Taís Fersoza, que exaltou as qualidades do acelerador da UOL.
Overdose
Na novela Sem Lenço, Sem Documento, produzida pela Globo em 1977, o autor Mário Prata levou a idéia da ação de merchandising ao extremo. Não satisfeito em realizar na novela o lançamento da Caloi Ceci – bicicleta desenhada especialmente para as mulheres -, o autor decidiu criar um grupo de personagens que iria mostrar todas as etapas de uma campanha publicitária para o lançamento do produto. Os publicitários eram vividos por Jayme Barcellos, Ney Latorraca, Jonas Bloch e Ivan Setta e as modelos da campanha eram interpretadas por Bruna Lombardi e Ana Helena. “O Mário Prata queria que o produto fosse de uma empresa com 100% de capital nacional e que estivesse sendo lançado realmente. A Caloi Ceci se encaixou perfeitamente no modelo e se tornou um sucesso de vendas até hoje”, lembra Igor Reis, diretor de marketing da Caloi.
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