Dando e levando pancadas, Randy “Carneiro” Robinson atravessou a vida. Mais apanhando do que batendo. É o que comove nessa biografia de um perdedor magnificamente interpretado por Mickey Rourke em O Lutador, de Darren Aronofsky. O filme venceu o Festival de Veneza do ano passado e estreia nesta sexta-feira (13) no País. O consenso entre jornalistas que cobriam o festival é de que a atuação de Rourke era responsável pelo Leão de Ouro, mas foi insuficiente para derrotar o candidato italiano Silvio Orlando, que ficou com o prêmio de interpretação masculina pelo filme Il Papà di Giovanna.
Não se trata nem de injustiça, porque o trabalho de Orlando é mesmo muito bom. Mas o de Rourke talvez tenha alguns ingredientes a mais, um especial: certa similitude simbólica entre a vida descrita pela ficção na tela e a existência real do ator, toda ela também marcada por acidentes de percurso, para usar uma expressão pudica. Rourke exibe no rosto gasto os altos e baixos de uma existência conturbada, e usa esse rosto, com generosidade, para dar viço a Randy. Vida a serviço da arte.
Esse personagem é o desacerto em forma de gente. Lutador de telecatch famoso nos anos 80, ele envelheceu e agora exerce a profissão em ringues decadentes, localizados em porões e frequentados por poucos aficionados, sedentos de sangue e emoções baratas. Randy tem o rosto marcado pela idade e o corpo em luta constante (e inglória) contra a ação do tempo. Bombado por esteroides, bronzeado artificialmente, cabelos oxigenados, é todo ele um combate constante da natureza contra a decadência.