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O legado de uma diva

Bibi Ferreira protagonizou também Gota d’Água (1975). A peça escrita por Paulo Pontes e Chico Buarque deu à atriz a oportunidade de viver uma personagem de coloração trágica. Talvez Joana tenha sido sua mais memorável interpretação – ninguém nunca superou sua versão para aquelas canções e ela ainda sabia, 40 anos depois, seus diálogos de cor. Impossível esquecer sua imagem no palco, sob rústicos tamancos de solado de madeira e tiras de couro, vestida de negro, cabelos desgrenhados, movendo-se como um bicho acuado. “Ela vai do musical à tragédia grega, um fenômeno raro”, surpreendeu-se, na época, o diretor de Gota d’Água, Gianni Ratto.

O público aprovou sua nova faceta: Gota d’Água ficou dois anos em cartaz entre Rio e São Paulo. Só no primeiro ano, havia feito 200 mil espectadores. Em 1983, ela voltou a brilhar em Piaf, homenagem à grande cantora francesa Edith Piaf. Sob direção de Flávio Rangel (1934-1988), Bibi não deixava mais dúvidas sobre seu talento dramático. Piaf ficou oito anos em cartaz, entre Rio, São Paulo e demais estados brasileiros.

Não satisfeita, Bibi impressionou novamente no início dos anos 2000, no espetáculo Bibi vive Amália, em que homenageava a fadista portuguesa Amália Rodrigues. Fez ainda dois recitais, Bibi in Concert e Bibi in Concert Pop, acompanhada de orquestra e coral.

Bibi dizia que o segredo da saúde era a vida regrada. Não fumava, não bebia. Em cena, exibia um perfil conhecido: os óculos escuros, braços levantados, físico ligeiramente atarracado, a voz característica. Mas, se a artista Bibi foi muito reconhecida, a mulher Abigail era familiar para poucos amigos fiéis, que conviveram com ela e sabiam de suas outras qualidades e manias.

Abigail era uma mulher boemia, que preferia a noite: geralmente acordava por volta das 15h, quando tomava um simples desjejum: café com leite, pão com manteiga. Não gostava de chocolate, mas isso não significava que tinha um apetite controlado. Pelo contrário – Bibi adorava comer feijoada de madrugada, quando não um suculento prato de coxinhas.

Suas preferências alimentícias, aliás, fariam qualquer nutricionista corar: Bibi adorava fast-food, era frequentadora assídua de lanchonetes como McDonald’s (sua preferida), onde se regalava com uma de suas bebidas preferidas, Coca-Cola. Mas havia também a Bibi mais suave, aquela que gostava de tomar chá nos finais de tarde, principalmente no Shopping JK – ou, quando não era possível, no hall do hotel onde estivesse hospedada. Tudo era motivo para fazer o que mais gostava de fazer: conversar durante horas.

Bibi Ferreira era uma mulher pouco afeita a exercícios físicos. Sua preguiça, aliás, vinha da infância, quando era obrigada pela mãe a se movimentar. Já adulta e independente, gostava de ficar acomodada no sofá de sua casa, onde assistia durante horas e com imenso prazer a antigos programas de balé que tinha gravado em VHS ou DVD. Desculpava-se dizendo ter uma coluna encrencada, o que limitava seus movimentos. Em parte, era verdade – Bibi só se sentava em cadeiras ou poltronas que fossem previamente preparadas com almofadas que a deixassem confortável.

Como não dirigia, era sempre conduzida e, nesses momentos, não gostava de ir no banco de trás dos carros. “Isso é para esposas”, dizia, acomodando-se no banco da frente, onde, aliás, podia se apoiar na alça localizada acima do vidro do banco de passageiro, o popularmente conhecido como ‘pqp’, como ela adorava dizer.

Quando finalmente se apresentou no Lincoln Center, em Nova York, em comemoração aos seus 90 anos, a felicidade era pelo ponto alto atingido pela filha de Procópio. “Estou na América”, saltitou ela, tão logo desembarcou no aeroporto.

Em sua última aparição pública, em 2018, Bibi viu-se homenageada em Bibi, uma Vida em Musical, espetáculo de um amigo querido, Tadeu Aguiar, com incrível atuação de Amanda Acosta. “Ela cantou as músicas, respondia quando alguém dizia ‘Bibi’ em cena e demonstrou estar emocionada”, lembra Aguiar.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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