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O jazz fora da caixa

O jazz caminhou bem nos últimos anos, ao contrário de uma certa premonição apocalíptica feita com alguma frequência sobretudo por jazzistas vigilantes da tradição. Em recente passagem pelo Brasil, Wynton Marsalis falou, do alto da Jazz At Lincoln Center Orchestra, de sua pouca simpatia pelo hip hop, uma música, para ele, capaz de levar seus ouvintes para um “estado negativo” da alma. Marsalis é coerente com a bandeira que escolheu para empunhar, mas sua pregação sobre o jazz levanta poeiras e, muitas vezes, o coloca em xeque, como quando confrontada com o line up de um festival que chega com nomes jovens, sem delimitações geográficas definidas e expoentes de uma música fresca e muito original.

O Mastercard Jazz Festival terá sua primeira edição dias 31 de agosto e 1º de setembro, com mais atrações internacionais do que nacionais. Sua programação tem ao mesmo tempo uma pulverização de linguagens e um certo perfil cultural em comum. Idealizado pela produtora Monique Gardenberg, e com curadoria de Zuza Homem de Mello e José Nogueira, além de Pedro Albuquerque (filho de Paulinho Albuquerque, que criou o Free Jazz Festival com essa turma), o projeto terá entrada gratuita e terá como palco a parte externa do Parque do Ibirapuera.

Não estarão lá os nomes famosos do jazz (um dos poucos benefícios da crise é fazer com que as empresas invistam em projetos com jovens para que haja viabilidade financeira). Os escolhidos, no entanto, contam com histórico para isso e devem justificar suas escalações. Lakecia Benjamim e o grupo Soul Squad fazem um hibridismo entre o instrumental e a música pop, cantada. “A voz e a instrumentação estão juntas, não é uma opção”, diz Lakecia, ao responder se a voz ajudaria uma canção a ir mais longe. Sua música é vigorosa, levando os temas para o terreno do R&B, um pouco de soul e muito groove. Ela não é uma essencialmente instrumentista do jazz, seu sax não fala bem esse idioma em suas incursões mais radicais e sequer está no protagonismo de sua proposta, mas o usa como uma cor que, com a Soul Squad, ajuda a criar um belo conjunto. Vive, em seu segundo álbum, a chance de estourar a bolha da carreira de sidewoman (ela tocou nas bandas de Macy Gray, The Roots, Alicia Keys e ele, Stevie Wonder).

Outro acerto é a escalação de Laura Jurd, uma trompetista inglesa absolutamente fora das caixinhas, autora de todos os temas. Sua agrupação bastante jovem responde por Dinosaur (não confundir com os roqueiros do Dinosaur Jr), com o tecladista de muitos timbres Elliot Galvin, o baixista de muitos diálogos com o trompete de Jurd, Conor Chaplin, e o baterista de aros e de pratos, Corrie Dick. O trompete é a força desse quarteto de espírito muitas vezes experimental, se é que é justo chamá-lo assim. Suas tantas ideias nunca parecem improviso, mas suor e composição escrita.

“O fato de o festival se realizar em um palco ao ar livre nos levou a priorizar um elenco com uma pegada mais forte e menos intimista. São trabalhos vigorosos, que, apostamos, trarão grandes surpresas ao público brasileiro”, adianta Zé Nogueira em um texto de apresentação do evento, explicando a ausência de propostas mais intimistas. “Neste primeiro ano, procuramos apresentar a nova geração do jazz, talentos que se destacam por um trabalho original, que levam o jazz adiante”, diz Monique, ao jornal O Estado de S. Paulo. Aos 35 anos, o trompetista Christian Scott simboliza bem as duas ideias. Seu som é sempre cheio, alucinado e sem restrições. Curiosamente, nascido na mesma New Orleans de Wynton Marsalis.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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