Seria – é, de qualquer maneira – um domingo especial para os cinéfilos. Neste 14 de junho, Carlos Oscar Reichenbach estaria completando 70 anos. 70! Mas ele morreu em outro 14 de junho, em 2012. Há três anos!

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Quando completava 67. Gaúcho por acidente de nascimento, Carlão, como era chamado, veio com um ano para São Paulo. Aqui estudou, virou homem, diretor, artista. Luminar do pensamento crítico e do cinema de autor, surgiu na Boca do Lixo. Os primeiros filmes foram curtas – episódios – em obras como As Libertinas e Audácia, a Fúria dos Desejos, em 1968 e 69.

Carlão sempre gostou de cinema, mas o desejo de virar diretor veio por meio da influência que exerceu sobre ele Luis Sergio Person. No começo dos anos 1960, Person, que estudara na Itália, fez um filme que virou cult – São Paulo S/A. Não foi o único mestre de Carlão. Roberto Santos, Anatol Rosenfeld, Paulo Emílio Salles Gomes, Mário Chamie, Décio Pignatari foram decisivos para sua formação. E Jean-Luc Godard.

Ele se inspirou na estrutura em quadros de Viver a Vida para fazer Lilian M, em 1974. Tinha 29 anos. Nos quase 40 anos seguintes, nunca mais parou de

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Filmar.

Fez filmes com a cara da Boca do Lixo – baratos, com sexo e violência. Filmes com títulos como A Ilha dos Prazeres Proibidos, Amor Palavra Prostituta, Império do Desejo, Extremos do Prazer.

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Como o francês Claude Chabrol, que foi chefe de fila da nouvelle vague com François Truffaut e Jean-Luc Godard, Carlão poderia dizer que filmava não importa o que, mas nunca não importa como. Ele construiu sua ética e estética no ato de filmar. E aí, em 1985, com Filme Demência, a sua versão de Fausto, algo houve – o reconhecimento.

O filme ganhou os prêmios de direção e da crítica no Festival de Gramado. Com o filme seguinte, Anjos do Arrabalde, ele venceu de novo em Gramado, em 1986 – e agora o Kikito principal. O longa seguinte, Alma Corsária, foi o grande vencedor de Brasília em 1993.

Dez anos depois, venceu de novo (prêmio do júri) em Brasília com Garotas do ABC. Fez só mais dois longas depois, um polêmico, Bens Confiscados, e outro admirável, Falsa Loira.

Animador cultural, Carlão tinha um gosto que se pode definir como eclético. Adorava o Scarface de Brian De Palma (com Al Pacino) e colocava num panteão particular, como autor de seu coração, o italiano Valerio Zurlini, de A Garota com a Valise, Verão Violento, Dois Destinos e O Deserto dos Tártaros.

Mas talvez por sua origem na Boca do Lixo, Carlão tinha o pé no trash e defendia apaixonadamente diretores italianos que os críticos ditos ‘sérios’ consideravam de segunda linha, sensacionalistas, vulgares. O intimismo refinado de Zurlini era só metade de seu gosto.

Criou as sessões malditas do Comodoro para estimular a formação de um novo olhar por parte das novas gerações. Quando o Comodoro fechou, levou seu espírito para as sessões Malditas do Cinesesc. Detestava o cinema de mercado certinho, com roteiro.

Xingavas as comissões e os filmes brasileiros que tenta(va)m o Oscar. Mas curtia os diretores de mercado que esculhambavam com tudo, tipo Ruggero Deodato, autor de Cannibal Holocaust, precursor de A Bruxa de Blair. Zurlini e Deodato no mesmo altar? O importante, para Carlão, era não ter preconceito.