A pintura O Casamento Desigual (1525-1530), atribuída a um seguidor do artista flamengo Quentin Metsys, vem sendo tema de um caso complicado, os desdobramentos das ações nazistas cometidas na Europa. Desde 2008, herdeiros do judeu alemão Oscar Wassermann reivindicam a obra, que hoje pertence à coleção do Masp (Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand). A história foi revelada na quinta-feira, 13, em reportagem do jornal O Globo.

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“Não tivemos até agora uma resposta do Masp”, afirma o advogado Henning Kahmann, do escritório berlinense Von Trott zu Solz Lammek, que representa os requerentes. Segundo documento enviado ao museu, Heddy e Karin, filhas de Oscar Wassermann, de família de banqueiros e morto em 1934, foram forçadas a vender a pintura em 1936 para poderem pagar a “taxa de saída” imposta pelo governo nazista alemão aos judeus que tinham outra saída a não ser emigrar do país. Assim, o óleo sobre madeira caiu no mercado de arte. Foi doado, em 1975, pelo barão Thyssen-Bornemisza ao museu brasileiro. Em comunicado, o Masp diz que “tem como norma não se pronunciar sobre eventuais dúvidas relativas à procedência de obras de seu acervo”.

Em entrevista por e-mail concedida ao jornal O Estado de S.Paulo, Henning Kahmann conta que o segundo contato com o museu ocorreu em 2011, por meio de uma carta traduzida para o português. “Sem reação”, afirma, o escritório de Berlim contatou, em abril de 2013, o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico paulista (Condephaat). “Sabemos que o caso leva tempo”, diz o advogado. “Seria justo se o Estado de São Paulo restituísse a obra que foi doada ao Masp”, completa Kahmann sobre um possível acordo entre as partes baseado nas resoluções da Conferência de Washington de 1999 sobre os bens confiscados de judeus durante o nazismo.

Como opina o historiador Luiz Marques, o museu brasileiro “é inocente nesse caso, recebeu a obra em doação”. Ex-curador do Masp, até 2004, ele conta que a instituição já foi objeto de investigação das comissões de famílias judaicas expropriadas e que “sempre teve suas aquisições completamente legitimadas”. “Não é uma peça excepcionalmente importante, há uma versão com mais autoridade na National Gallery, mas o museu é um lugar público em que as obras estão acessíveis de uma forma geral. Mas é normal que se você fosse da família, você se sentiria de outra maneira.” Entretanto, o historiador afirma que mesmo sendo uma pintura atribuída a um seguidor de Metsys, trata-se de um testemunho de relevância dos desenhos do artista de suas pesquisas sobre fisionomias.

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O Casamento Desigual é, ainda, um exemplar importante na formação de um conjunto de arte flamenga da instituição, “o que é uma preciosidade para um país da América Latina”, diz o curador Fábio Magalhães, que foi conservador-chefe do Masp entre 1990 e 1994. Ele considera que o museu seja “vítima” nesse caso da “história triste da humanidade”, tema atualmente também presente no filme Caçadores de Obras-primas e no livro O Museu Desaparecido, de Hector Feliciano (WMF Martins Fontes). As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.