Programas que premiam os participantes com dinheiro não são novidade na televisão brasileira. Só para lembrar os mais recentes, depois do fenômeno “Show do Milhão” e da onda dos “reality-shows” com prêmios polpudos, até os típicos programas de variedades, como o “Mais Você”, de Ana Maria Braga, e o “Falando Francamente”, de Sônia Abrão, resolveram investir no filão para garantir audiência. Os desafios remunerados também fazem a alegria no “Caldeirão do Huck”, no “Domingão do Faustão” e nos recém-estreados “Jogos de Família” e “Roleta Russa”, da Record. A estréia de “No Vermelho”, no entanto, levanta questionamentos que vão além da estratégia de conquistar o telespectador pelo bolso.
Apresentado por José Luiz Datena, o programa da Record explora as misérias humanas, tentando extrair delas material dramático para envolver a audiência. O tom da atração não é dado pelas aventuras de participantes atrás de uns trocados ou de seus 15 minutos de fama, como acontece nos programas do gênero, mas pelas histórias de vida dos quatro concorrentes, que disputam a cada semana a garantia de ter saldadas suas dívidas, no valor de até R$ 25 mil. Cada um deles ganha um clipe com direito a narração consternada e trilha sonora digna de dramalhão mexicano.
Dramas verdadeiros
Seria até morbidamente engraçado, não fosse a gravidade da situação. Os dramas são verdadeiros e os personagens, reais. Desesperados pela crise financeira, eles viram estrelas de uma tevê também em crise – se lhes falta dinheiro, a ela falta ética. Se a realidade faz desempregados e endividados recorrerem a um “game” televisivo como última tentativa de resolver seus problemas econômicos, a tevê os transforma em atrações dominicais. A média de audiência do horário, antes ocupado por transmissões esportivas, subiu de três para quatro pontos no último domingo, com a estréia do programa, às 19 h. Já a lista dos interessados em expor suas dificuldades ganhava, ainda antes da estréia, cerca de 2 mil novos nomes diariamente.
Depois de apresentadas as histórias dos participantes, o programa transcorre como qualquer outro com disputa de provas. À exceção, é claro, do constante apelo à pieguice. Algumas provas são até bem criativas, como uma em que os participantes devem encontrar e fotografar uma pessoa na platéia, de acordo com as características anunciadas por Datena. Também é boa a idéia da participação dos familiares e amigos dos concorrentes em algumas provas, nas quais fazem mímicas ou têm de acertar a música cantarolada pelo competidor. As provas de perguntas e respostas também são menos tolas e superficiais que as questões do “Show do Milhão”, por exemplo.
Excessos
De fato, as provas são o que há de menos comprometedor em “No Vermelho”. Quanto à condução de Datena, o apresentador parece estar à vontade. O problema é a insistência em alguns recursos que beiram o insuportável, como a solicitação excessiva da participação do auditório. As palmas e manifestações de apoio aos concorrentes são exploradas ao extremo. Também há que se ter paciência com o bordão “aperta o botão, dinheiro na mão”, que Datena repete com a platéia a cada vez em que os participantes computam os valores ganhos nas provas. São quatro participantes e cerca de seis provas. Dá para imaginar o quanto é repetitivo.
Outro recurso batido e forçado é o contraponto entre o apresentador e a “juíza” Rachel, que aparece em “off” para ditar as regras da competição. Estabelece-se então o eterno conflito entre Bem e Mal, com Datena fazendo-se passar por defensor dos participantes. A todo o tempo ele questiona as regras do jogo, pede mais tempo para a realização das provas, lamenta a necessidade de eliminar os concorrentes. E a “juíza” faz o papel de durona… Tudo soa muito falso. No final, a única emoção verdadeira que o “No Vermelho” proporciona é a do vencedor, ao ver resolvidos seus problemas momentâneos.