Novo presidente da Fundação Teatro Municipal do Rio, o ator Milton Gonçalves rebateu a crítica de que não tem experiência em gestão, tampouco proximidade com o universo erudito. “Eu aprendi muito na vida, andei por esse Brasil e esse mundo, o que me deu um olhar muito crítico. Estou bem armado e bem aberto, conhecendo a estrutura toda. Nós sabemos que temos essa responsabilidade, estamos correndo atrás. Não vamos fazer milagres, mas nossa paixão é o espetáculo, é o teatro, a arte e a cultura”, disse Milton, que atendeu a reportagem do jornal “O Estado de S. Paulo” na tarde desta quinta-feira, 23, durante uma reunião com a futura equipe.

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O anúncio de seu nome, na quarta, 22, pelo secretário estadual de Cultura, André Lazaroni, foi mal recebido no meio erudito pelo fato de, diferentemente de seus antecessores, Milton não ser ligado à música clássica, ao balé e à ópera, que são as vocações da casa, e de possivelmente carecer de instrumentos para lidar com uma estrutura complexa – o Municipal é o principal equipamento cultural do Estado, e só de integrantes dos corpos artísticos, são mais de 300.

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Também foi criticada a possibilidade de a escolha de Milton ter motivação política. O ator é filiado ao PMDB (filiou-se ao MDB nos anos 1960, quando de sua fundação), mesmo partido do recém-nomeado secretário (ex-líder do partido na Assembleia Legislativa do Rio) e do governador Luiz Fernando Pezão.

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“As pessoas que criticaram não me conhecem, não sabem dos discos que tenho em casa, não sabem que desde menino sempre gostei de ir ao Municipal de São Paulo, e, depois, do Rio, para ver música erudita, ópera. Na minha adolescência queria ser cantor de ópera. Elas acham que a gente não sabe (gerir). Mas a gente sabe”, afirmou.

O novo presidente terá de lidar com um corpo de funcionários insatisfeitos, por conta do parcelamento e atraso de salários, motivados pela crise financeira do Estado, e da falta de perspectiva quanto ao 13º. Os espetáculos previstos na programação para 2017, desenhada pela equipe que está de saída, deverão ser mantidos, mas, a princípio, só os contratos que tiverem sido firmados.

Milton também comentou o fato, destacado por Lazaroni, de ser o primeiro presidente negro do Municipal. “Sou o primeiro, e por isso mesmo quero fazer o melhor possível, para que não tenham motivos para dizerem depois: ‘É negro e fez errado’. Ficam dizendo: ‘É negro, não tem conhecimento de teatro clássico. Eu tenho. Viajei muito, Deus me ajudou. Estou aqui falando com muita emoção. Neste momento sou uma daquelas milhares de pessoas que querem dignidade para o brasileiro.”

Para além dos mais de 50 anos de experiência de TV, cinema e teatro – é o mais antigo ator da TV Globo em atividade -, Milton listou a experiência na esfera pública: foi superintendente da Radiobras (antiga Empresa Brasileira de Comunicação), membro do Conselho de Cultura do Rio e do Conselho de Artes do Paço Imperial, e subsecretário de gabinete na gestão Marcello Alencar (1995-1999). Hoje é membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (órgão consultivo da Presidência da República) e do Conselho Nacional de Política Cultural (colegiado do Ministério da Cultura que tem como finalidade propor a formulação de políticas públicas do setor).

O ator anunciou dois nomes de sua confiança para sua equipe, o de Ciro Pereira da Silva, atual coordenador da Central Técnica de Produções do teatro, e de Lívia Parente, que já trabalha com ele. Silva, que é servidor há 40 anos e nos anos 1970 foi diretor do teatro, quando o equipamento ainda não tinha status de fundação, será vice-presidente, e Lívia, chefe de gabinete.

Silva declarou ao jornal que uma diretriz da nova gestão, cujo objetivo é “popularizar o teatro”, nas palavras do secretário Lazaroni, será ampliar o programa que leva estudantes ao prédio centenário da Cinelândia. “O teatro já tem um programação muito popular, que tem que ser ampliada, como o Projeto Escola. É educativo e forma plateia, cria hábito, quebrando o tabu de que se você não tiver uma roupa de grife ou um sapato específico você não pode entrar ali. O teatro é público e o público tem que ser um consumidor daquilo.”