Nos últimos livros que publicou, o escritor Manoel de Barros contou com a participação de Martha que, artista, realizou delicadas iluminuras com sua interpretação da obra do pai. Sobre o assunto, ela respondeu, por e-mail ao jornal O Estado de S. Paulo, as seguintes questões:

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Como surgiu o amor de Manoel pelas coisas sem importância?

Ele sempre teve esse olhar para baixo. Um pouco pela sua infância na fazenda, livre e integrada à natureza, um pouco pelo seu temperamento de caramujo. Vêm daí as coisas pequenas e sem importância que permeiam e inspiraram sua poesia.

O mundo contemporâneo estava explícito nos versos de Manoel. A prosa seria, assim, o melhor abrigo para histórias pessoais?

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Sua poesia é autobiográfica, mas em sua prosa poética talvez fique mais explícita essa sua fonte que está na infância.

Manoel tinha algum ritual de criação ou a base da sua produção era a pura inspiração?

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Manoel não acreditava na inspiração e dizia que somente o trabalho e a transpiração podiam lhe render um poema. Tinha um ritual de trabalho muito rígido, subia todos os dias para seu escritório, das sete às onze horas da manhã, para ler e escrever. Até aos sábados. Esse ritual, no final de sua vida, se estendeu até aos domingos.

O Manoel que surgia da poesia não era o mesmo daquele pessoa física, em carne e osso. Quem era o verdadeiro Manoel?

Só houve um homem – alegre e brincalhão, amigo e conselheiro. Pelas tardes, recebia qualquer pessoa com hora marcada para conversar.

Gostava da família e se preocupava com todos. Um homem normal, extremamente humano e sensível. Na sua obra dava cambalhotas e se permitia ser criança. Como poeta, sua criação não tinha limites. Nessa antologia tem um poema – Os dois, de Poemas rupestres – em que ele fala poeticamente disso:

“Eu sou dois seres.

O primeiro é fruto do amor de João e Alice.

O segundo é letral:

É fruto de uma natureza que pensa por imagens,

Como diria Paul Valéry.

O primeiro está aqui de unha, roupa, chapéu

e vaidades.

O segundo está aqui em letras, sílabas, vaidades

frases.

E aceitamos que você empregue o seu amor em nós.”

Como era trabalhar ao lado dele? Seus desenhos o inspiravam também? O que mais a inspirava: a poesia ou a prosa dele?

Sua poesia sempre foi fonte de inspiração para muitos artistas. Acredito que por ser também uma poesia imagética. No meu caso, tem mais um componente. Somos parecidos de temperamento e bebemos da mesma fonte – a força da natureza do Pantanal. Sua poesia é libertadora e trabalhar ao seu lado sempre foi um prazer.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.