Com 80 anos completos em 2005, o escritor paranaense e membro da Academia Paranaense de Letras Noel Nascimento lança, simultaneamente, três obras que traçam um panorama da história do Brasil, um novo humanismo e uma coletânea de contos fantásticos.
A noite de autógrafos acontece nesta quarta, dia 6 de abril, às 20h, no Canal da Música (Rua Júlio Perneta, 695 – Mercês) com o lançamento de A Revolução do Brasil (uma visão dos conflitos armados no País no fim do século XIX e uma radiografia dos movimentes rebeldes camponeses, com destaque para a Guerra do Contestado), A Nova Civilização, (romance humanista que mergulha na alma de um povo cordial, miscigenado por raças boas e fortes) e Contos Fantásticos, trazendo personagens memoráveis da história do Paraná, como João Maria, o monge da Lapa, e a presença mítica da Loira Fantasma, que assombrou o imaginário dos curitibanos na década de 70.
Noel Nascimento nasceu em Ponta Grossa em 1925 e formou-se em Direito, atuando como promotor em várias cidades do interior. Colaborou durante décadas em jornais e revistas com ensaios, poemas e textos literários. Publicou A Justiça e o fim da Repressão, Casa Verde, Coreto de Papel, A Nova Estética, A Escola Humanista. Em 1995 ganhou o Concurso Nacional de Romances, promovido pela Secretaria de Estado da Cultura com Arcabuzes. Considerado um romance épico, revela a ascenção da burguesia ao poder, com a abolição e a consolidação da República após a guerra civil de 1894.
?Procurei revelar a vida, as lutas, a alma do povo no momento de transição do poder do campo para a cidade, como e qual foi o mais importante acontecimento histórico da pátria brasileira. Num dos primeiros capítulos há a visão de que o homem tem relações primordiais e, antes de tudo, de quaisquer condições, é pessoa. Como tal, um valor infinito?, relata o escritor.
Serviço:
Lançamento de livros e recital de piano:
Na abertura da noite de autógrafos haverá um recital de piano com Noel Nascimento Filho, pianista premiado e professor da Escola de Música e Belas Artes do Paraná. Ele estará homenageando seu pai com o programa: Beethoven: Sonata opus 53 -1.º Movimento (allegro) e Chopin: Fantasia Opus 49.
A Revolução do Brasil, A Nova Civilização, Contos Fantásticos .
Autor: Noel Nascimento.
Local: Canal da Música (Rua Júlio Perneta, 695 – Mercês).
Data: 6 de abril de 2005.
Horário: 20h.
Veja abaixo
Entrevista exclusiva de Noel Nascimento concedida à jornalista Janine Cirino dos Santos em setembro de 2004.
Janine dos Santos: Fale um pouco sobre sua relação com a poesia, os poetas que você tem lido, aqueles que você considera que influenciam você.
Noel: A relação com a poesia começa com o abrir dos olhos, mas em versos a minha iniciou-se nos anos escolares e não tem fim. É com poetas de todos os tempos, os clássicos, românticos, parnasianos, simbolistas, modernistas e das mais diversas correntes estéticas. São indeléveis as impressões de Camões, Antero de Quental, Bocage, Fernando Pessoa, Castro Alves, Gonçalves Dias, Thomas Antônio Gonzaga, Olavo Bilac, Raimundo Correia, Augusto dos Anjos, Cruz e Souza, e de uma infinidade de poetas que antecedem a minha admiração pelas subseqüentes gerações no Brasil chefiadas e sob a influência de Mário de Andrade. Devo-lhes a visão que tenho da poesia como expressão da intuição do bem e do belo na vida e na natureza.
JS: Como a leitura influenciou sua vida?
Noel: A leitura influenciou minha vida, conscientizou-me da evolução do homem, a sua fascinante quanto desesperada luta pelo progresso material e espiritual. A boa obra literária orienta-o ao autoconhecimento, à tolerância, aos valores da dignidade humana, à denúncia de desumanidades, à conquista de um mundo de paz, justiça e fraternidade. É desnecessária a citação de um Victor Hugo, Dostoievski, Tolstoi, Gorki ou Houward Fast e maiores exemplos.
Js: O que você procura com sua escrita e o que tem determinado sua criação literária?
Noel: O que procuro na poesia está implícito no que disse acima sobre a visão que dela tenho. Na prosa busco também a verdade, uma correta interpretação da realidade social, sem perder de vista as correlações econômicas, lutas sociais, e a importância do coração do homem como motor de sua evolução na história.
JS: Segundo sua ótica, o escritor deve estar mais comprometido com o fazer literário ou com o todo da vida social? É necessário que a escrita tenha sempre um fundo social e não apenas estético?
Noel: Não há como ignorar nem separar o vínculo estético do social.
JS: Como você vê a literatura que está sendo feita hoje no Brasil?
Noel: A atual literatura reflete a diversidade cultural no País, a desigualdade no desenvolvimento, porém com representação positiva do bom espírito brasileiro.
JS: Fale um pouco sobre a problemática editorial e a divulgação dos autores menos conhecidos… Você acha que a internet tem influenciado essa questão?
Noel: Considero o livro um documento para sempre. O autor deve publicá-lo, vencendo o obstáculo da editoração. A divulgação depende de iniciativas e ações do próprio, colaborações em jornais, revistas, participação em associações, instituições que os congreguem. Para mim a internet tem sido a maior das soluções para divulgação em todo o País e no mundo. O meu site http://www.astrovates.com.br tem uma visitação muito grande, em média oito mil por mês, atingindo desde 1.997 quase dois milhões de ?hits? – a maior parte do Brasil, Estados Unidos e países de língua portuguesa e espanhola.
JS: Como você vê a influência da cultura de massa na literatura brasileira atual?
Noel: A cultura de massa constitui uma fonte natural que suscita análise e aproveitamento, pois é rica em aspectos positivos.
JS: O que você acha do trabalho das editoras alternativas?
Noel: É clara a necessidade do trabalho das editoras alternativas.
JS: De que forma o Paraná contribuiu para sua formação literária?
Noel: O Paraná influiu em toda a minha formação, também na literária. Ponta-grossense, no lar, na escola, no ginásio, depois na universidade em Curitiba, na promotoria de justiça e bancas advocatícias em diversas cidades do interior, por fim em Guarapuava e, em Curitiba, quando anistiado, retornei aos quadros do Ministério Público.
JS: O que significou o Prêmio Nacional de Romance conferido à sua obra Arcabuzes?
Noel: O Prêmio Nacional de Romance que me foi conferido teve uma significação extraordinária por causa da constituição, na comissão julgadora, de dois grandes escritores em constante atividade no Brasil, Ignácio de Loyola Brandão e Dionísio da Silva, além da historiadora paranaense Jane Sprenger Guimarães. Representou o reconhecimento de um romance épico brasileiro que realmente aconteceu.
JS: Arcabuzes pretende restaurar a memória nacional com uma nova visão histórica. Que visão seria?
Noel: A visão em Arcabuzes ainda é original, não suficientemente conhecida e, em conseqüência, não compartilhada. Porém, a da verdade histórica. A de que houve no Brasil uma revolução das classes urbanas, da burguesia nacional, cujos marcos decisivos foram a abolição da escravatura, a proclamação e consolidação da República Federativa.
A de que, ainda antes da Segunda Guerra Mundial, houve três grandes revoluções da burguesia no Ocidente: a francesa, a americana e a brasileira, cada qual com características próprias. Demonstro em Arcabuzes as do Brasil, como as da contra-revolução que levaram à guerra civil, então impropriamente designada ?revolução federalista?, na verdade uma contra-revolução antifederalista, de caráter reacionário, intuitos restauradores, até mesmo separatistas, além de anárquica. Procurei revelar a vida, as lutas, a alma do povo no momento de transição do poder do campo para a cidade, como e qual foi o mais importante acontecimento histórico da pátria brasileira. Num dos primeiros capítulos há a visão de que o homem tem relações primordiais e, antes de tudo, de quaisquer condições, é pessoa. Como tal, um valor infinito.
JS: Qual é a principal característica do novo período literário?
Noel: A principal característica do novo período literário é a reconstrução, anunciada por Jacques Maritain e autores que conspiram por uma nova ordem; reconstrução enriquecida com o personalismo de Emmanuel Mounier, doutrinas de ações de paz e boa vontade, não-violência, a exaltação do real e do humano numa ?arte pelo bem?, de amor com conteúdo essencial; uma revolução pela fraternidade; a elevação do homem à conscientização cósmica. Mas num realismo humanista pode e deve ser exibido o mal, o grosseiro, o trágico, como expostas são as feridas para curá-las.
JS: O que é escrever poesia, hoje, na contemporaneidade? Clarice Lispector disse ?escrever é uma maldição, mas uma maldição que salva?… Você, escritor, como se posiciona diante dessa declaração?
Noel: Acho que escrever é uma bem-aventurança, expressar um dom, dádiva numa missão ou tarefa tão digna quanto a de todos os trabalhadores, contribuindo para a evolução do homem, a grandeza de seu destino, descortinando-lhe a verdade, a beleza, o encanto, a sublimidade na vida e na natureza.