No Rio, peças reveem glórias e paixões de Maria Callas

Com apenas 13 anos, Fernando Duarte foi arrebatado pela voz de Maria Callas. A vizinha era professora de canto lírico e, a despeito da barreira idiomática, o menino se encantou por aquele som tão vivo quanto triste que atravessava as paredes. O encantamento perdurou a vida toda, e o motivou, já adulto e envolvido com o universo teatral, a pesquisar e escrever sobre a maior cantora da história da ópera.

Duarte é autor de duas peças sobre ela que estão em cartaz no Rio: “Callas”, no Teatro do Leblon (Sala Fernanda Montenegro), com Silvia Pfeifer no papel-título, contracenando com Cássio Reis, e “Orgulhosa Demais, Frágil Demais”, em cartaz no Centro Cultural Correios, com Rita Elmôr (Callas) e Samara Filippo (Marilyn Monroe).

São duas fotografias de momentos-chave da trajetória de “la divina”. A temporada simultânea foi um acaso, motivado pela obtenção dos patrocínios para as montagens. Outra coincidência foi o fato de a primeira ser dirigida por Marília Pêra e a segunda, por sua irmã, Sandra Pêra.

Duarte tem apenas uma outra peça no currículo (“À Beira do Abismo Me Cresceram Asas”, encenada ano passado por Maitê Proença e Clarisse Derzié Luz). A carreira de autor teatral é recente: ele era técnico, camareiro e faz-tudo em teatros do Rio quando conheceu Marília, cinco anos atrás, durante a temporada de “Doce Deleite”, que ela dirigia.

Assim que concluiu o texto de Callas, logo o enviou para a atriz. Colecionadora de discos, fotos e reportagens sobre a cantora, ela é considerada uma especialista em sua vida desde a bem-sucedida experiência em “Master Class”, espetáculo de 1996 no qual vivia a soprano. Já Sandra foi convidada para dirigir “Orgulhosa Demais, Frágil Demais” pela produção da peça.

“Ninguém fica indiferente à voz de Callas, e comigo foi assim”, conta Duarte, que rapidamente recebeu o “sim” de Marília. “Achei muito bonita a trajetória dele no teatro e me interessei pelo texto. É a Callas na véspera de sua morte, aos 53 anos e muito só. Ela não tinha perdido não só a voz, mas a coragem de cantar”, define a diretora.

Marília garante não ter sentido ciúme de Silvia ao vê-la na pele de um de seus personagens mais célebres no teatro. “É um sentimento que nunca tive. Faço teatro desde os 4 anos e já interpretei não sei quantos personagens. Quando acaba uma temporada, eu viro a página. Em Doce Deleite, a Camila Morgado faz o meu papel dos anos 80. Acho bom que os atores mais velhos passem adiante o que aprenderam”, admite.

No palco, Silvia é a “imperatriz do bel canto” num momento diferente daquele que Marília apresentou em “Master Class”. É 15 de setembro de 1977 e Callas está em Paris com seu amigo John Adams (Cássio Reis). O jornalista e ela abririam no dia seguinte uma exposição com seus figurinos, LPs e joias.

Rememorando melancolicamente o turbilhão em que sempre viveu, fala sobre as glórias no palco, a rivalidade com outras cantoras, a paixão pelo milionário grego Aristóteles Onassis, o qual perdeu para Jacqueline Kennedy, o filho que teve com ele, que morreu pouco depois de nascer e que foi rejeitado pelo pai.

A mulher que fora uma das mais famosas do mundo, considerada a maior celebridade da ópera no século 20 e a maior soprano e cantora de todos os tempos, se mantinha reclusa em seu apartamento na elegante avenida parisiense Georges Mandel, com dois funcionários, e morreria no dia seguinte, de ataque cardíaco.

Um sucesso na Broadway, “Master Class” trata das aulas que Callas dera na Juilliard School of Music, em Nova York, entre 1971 e 1972. Ela já estava em decadência, mas não perdera a arrogância de quem se sabe “a melhor”, e massacra os alunos. Era o princípio do fim. “Gosto de ópera, mas não conhecia muito esse lado da Callas. Pesquisei bastante para entender tudo o que ela sofreu”, diz Silvia.

A Maria Callas de Rita Elmôr tem 38 anos, e experimenta o ápice da relação com Onassis. A peça se passa no dia 19 de maio de 1962, nos bastidores do aniversário do então presidente dos Estados Unidos John Kennedy, no Madison Square Garden, em Nova York. Lá ela seria apresentada a Marilyn Monroe, que cantaria para o suposto amante seu célebre e sedutor “Parabéns Pra Você”.

Callas, que só estava ali para fazer um agrado a Onassis (ele queria conhecer Kennedy), se apresentou antes, com a popular ária Habanera, da ópera “Carmen”, de Bizet. A performance emocionou a atriz, que a procurou em seguida em seu camarim. A cantora foi ríspida e se arrependeu, mandando um buquê de flores posteriormente para Marilyn. Na ficção de Fernando Duarte, Callas se desculpa indo ao camarim de Marilyn. Lá, as duas divas de temperamentos opostos abrem o coração, trocam segredos, falam do desejo de serem mães de família e da impossibilidade de ter o dia a dia de uma mulher normal. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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