Desde que assumiu o papel de embaixador da música russa, Valery Gergiev tem rodado o mundo com a orquestra do Teatro Mariinsky (o antigo Kirov) com ciclos integrais de alguns dos principais compositores do país. Entre eles, está Tchaikovsky – e, nos últimos anos, maestro e músicos rodaram as principais capitais europeias tocando as seis sinfonias do autor. Em 2010, estiveram em Paris, quando as apresentações foram gravadas e transformadas em DVDs que saem agora em edição importada da Phillips (R$ 130, em média).
O pacote traz apenas as últimas três sinfonias – as mais famosas e, formalmente, mais bem realizadas de Tchaikovsky. Foram escritas entre 1877 e 1893 e, cada uma a seu modo, abordam temas caros ao compositor. Na quarta, o personagem principal seria o destino; na quinta, a providência divina; na sexta, os dois temas se misturariam ao desespero de um amor impossível, resultando em um testamento musical que antecederia a morte do autor.
Gergiev não gosta de conceder entrevistas, entre outros motivos, pela insistência da imprensa em abordar sua relação com o premiê russo Vladimir Putin – eles são compadres. Em outubro, no entanto, ele deu um depoimento em vídeo para o Carnegie Hall, onde realizou três concertos dedicados justamente a Tchaikovsky, e nele fala sobre a maneira como se aproxima de suas sinfonias.
Grande melodista, Tchaikovsky é criticado por uma suposta dificuldade em lidar com formas de composição amplas como a de uma sinfonia, o que levaria a partituras repetitivas e, virou um clichê afirmar, melodramáticas. Gergiev discorda. Começa falando das três primeiras sinfonias. São obras da juventude, concede. Até que, na terceira, algo acontece. Formalmente, não há grandes novidades; da mesma forma, a inspiração melódica já se manifestava nas obras anteriores, ainda que alcance, a partir daquele momento, níveis mais altos. O que, então, é diferente? “A orquestração passa a fazer toda a diferença”, explica o maestro. “E o motivo é simples. Tchaikovsky, a essa altura, já é um autor bem sucedido de óperas, um verdadeiro homem de teatro.”
Para Gergiev, o elemento teatral é fundamental na compreensão das últimas três sinfonias do compositor. “Elas são jornadas excitantes, ele nos conduz por meio de uma história que é a dele mas também a do ser humano como um todo.” Na quarta sinfonia, por exemplo, “ele vai direto ao seu coração”. “Há o silêncio e, de repente, uma música que desde o início é capaz de te arrebatar. Você não espera isso das sinfonias de Beethoven. Mas, em Tchaikovsky, é fundamental. Se você ignorar esse aspecto, então jamais vai compreender a grandeza dessas sinfonias. Pena.” Essa percepção atravessa a quarta e a quinta sinfonias, mas é na sexta que atinge seu ápice. Gergiev a define como a obra-prima do compositor, sua sinfonia mais perfeita – e extrai dela, até os últimos suspiros da música, uma riqueza ímpar de coloridos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.