A história de uma cantora de rock transexual alemã, que cresceu na porção oriental de Berlim, quando o muro ainda dividia a cidade em duas, em busca de um amor que a completasse, fez sucesso no circuito off-Broadway de Nova York a partir do final dos anos 90.

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O musical, escrito e encenado pelo ator e cineasta John Cameron Mitchell (diretor de “Shortbus” e que também levou a peça para as telas, em 2001) e cujas canções foram compostas pelo músico Stephen Trask, ganhou versões em diferentes palcos pelo mundo até aportar no Rio de Janeiro, no ano passado, pelas mãos do ator, diretor e músico Evandro Mesquita. Agora, “Hedwig e o Centímetro Enfurecido” faz sua estreia na capital paulista hoje, no Teatro Nair Belo.

“Sempre quis fazer algo parecido com uma ópera rock e mesmo o trabalho na Blitz tem esse lado teatral forte, com músicas citando personagens e cenários”, comenta Mesquita. “Apesar de ser uma história passada longe em vários pontos, ela está perto de nós e o rock ajuda nessa proximidade”, diz o diretor.

Na adaptação que fez em parceria com o diretor de produção Jonas Calmon Klabin, Mesquita inovou em relação às outras montagens e colocou a personagem principal em cena interpretada ao mesmo tempo por dois atores para assim demonstrar o que ele considera a bipolaridade de Hedwig.

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“Sublinhando essa dramática história por baixo da peruca e da purpurina”, diz ele. A solução, explica, possibilitou uma carpintaria cênica mais dinâmica, materializando algumas situações que eram apenas narradas no texto original.

Antes de ser Hedwig, a cantora foi Hansel, um ingênuo garoto que vivia com a mãe autoritária e escutava – de dentro do forno da casa, para evitar a irritação materna – clássicos do rock sintonizados numa rádio americana.

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Querendo se libertar da situação opressora que vivia na Berlim oriental, a vida do jovem começa a mudar quando ele conhece o oficial americano Luther, que se encanta com a delicadeza dele.

Acreditando ter encontrado o amor, Hansel aceita a condição imposta por Luther para que os dois se casem: fazer uma operação de mudança de sexo. Só que a cirurgia dá errado e fica sobrando o tal “centímetro enfurecido”.

Já nos Estados Unidos e abandonada pelo militar, Hedwig conhece o adolescente Tommy, para quem apresenta suas composições roqueiras. Mas num golpe do destino, aquele que ela achava finalmente ser o seu complemento amoroso, rouba suas músicas e estoura como um astro pop. E é de um restaurante decadente, próximo ao estádio onde Tommy faz seu megashow, que Hedwig conta e canta sua história.

Realmente, a ação transcorre com naturalidade com a interação das duas versões da roqueira que representam facetas da mesma Hedwig – uma loira, interpretada por Pierre Baitelli, e outra morena, papel de Felipe Carvalhido.

“Pelo fato de ela ser essa figura esquizofrênica e multipolar, isso permite que cada uma tenha a sua diferença”, comenta Baitelli sobre a composição de cada um deles para a personagem.

A dupla contracena com a atriz Eline Porto, que solta a voz nos papéis de Yitzhak, músico croata que integra a banda da cantora, e Tommy, usando um capuz a la Justin Bieber.

“Antes de fazer o ‘Hedwig’ só ouvia bossa nova e jazz”, diz ela. O palco abriga ainda os músicos Diego Andrade (bateria), Melvin Ribeiro (baixo), Fabrizio Iório (teclado) e Pedro Nogueira (guitarra), que fazem as vezes da banda Centímetro Enfurecido.

Caracterização – A caracterização dos dois atores – cuja maquiagem leva cerca de uma hora para ficar pronta – impressiona. Especialmente Baitelli, o Carlo Berganti da série “Lara com Z”, da rede Globo, que, “montado”, lembra uma versão drag queen da atriz Uma Thurman, e se destaca também pela energia rock’n roll no palco.

Ele foi indicado como melhor ator na edição carioca do Prêmio Shell do segundo semestre do ano passado – Evandro Mesquita e Danilo Timm foram indicados por melhor direção musical – e ganhou nesta categoria no Prêmio Arte Qualidade Brasil.

Na temporada paulistana, Carvalhido substitui o ator Paulo Vilhena. A primeira experiência dele em cantar rock foi com o musical “Peter Pan”, no qual ele fazia o Capitão Gancho.

Com entrou de última hora para o elenco, ele diz que entendeu o universo do espetáculo após assistir ao filme “Velvet Goldmine”, dirigido por Todd Haynes, em 1988, assim como a produção inspirada na peça. “Show de rock é performance pura.”

Além dessas referências cinematográficas para compor o espetáculo, o elenco escutou muito dos clássicos de David Bowie, Iggy Pop, Lou Reed e Velvet Undergroud e também a banda Florence and the Machine, formada na década passada.

“Mas a peça e as canções são fortes o suficiente para inspirar como um soco no estômago e esse clima é despejado nos atores e no público rápido e direto, como o rock and roll”, diz Mesquita.

 

Hedwig e o Centímetro Enfurecido

Teatro Nair Bello

Shopping Frei Caneca – Rua Frei Caneca, 569 – 3.° andar.

Telefone: (11) 3472-2414. Sexta, às 21h30. Sábado, às 21h. Domingo, às 18h. Ingressos: R$ 60