Cobertas com o hábito, algumas freiras driblam e comemoram gols enquanto jogam bola no time das funcionárias do Hospital Santa Marcelina, no bairro de Itaquera, em São Paulo. “”Fotografá-las foi encontrar um mundo particular, harmonioso, que, na essência, rompe o silêncio da meditação para correr em direção ao grito de vitória”, conta a fotógrafa Eliária Andrade, que criou um belo ensaio de imagens em preto e branco registrando as religiosas no exercício de uma paixão inusitada, o futebol.
Essa é apenas uma das histórias – surpreendentes – das 121 obras da exposição As Donas da Bola, que será inaugurada neste sábado, 17, às 16 h, no Centro Cultural São Paulo. A Copa do Mundo está chegando, mas as 11 fotógrafas que participam da mostra aproveitaram o momento para trazer o tema do futebol através de um prisma diferente, duplamente feminino – são mulheres registrando mulheres e sua relação com o esporte, mulheres “observando a garganta da realidade, o Brasil diante de si mesmo”, como afirma o curador Diógenes Moura. “É uma reflexão sobre um país que não reflete sobre nada”, continua o escritor.
A ideia do projeto, que também se desdobra em livro, partiu das fotógrafas, profissionais destacadas do fotojornalismo, em 2012. “É um tema masculinizado”, diz Mônica Zarattini, do Estado, que fotografou as meninas do time Amizade Futebol Clube na pobre Parada de Taipas, São Paulo. De maneira divertida, ela se refere ao grupo de expositoras como “coletivo dinossauro”, formado ainda por Nair Benedicto, Marlene Bergamo, Ana Carolina Fernandes, Luludi Melo, Marcia Zoet, Bel Pedrosa, Ana Araújo, Evelyn Ruman, Luciana Whitaker e Eliária Andrade. Cada uma definiu sua “pauta” nas reuniões. E mesmo sem patrocínio, no início, elas começaram a realizar suas obras em 2013, por conta própria.
Ana Carolina Fernandes, por exemplo, foi até o Amapá para fotografar o “futelama”, misto de jogo feminino e atração turística, descreve, que depende da maré do rio Amazonas. Já Bel Pedrosa entrou na casa de torcedoras – fanáticas? – cariocas. Suas imagens, coloridas, mostram quartos com cantos para os santos (São Jorge, Buda, Shiva) e faixas de times, ou a expressão da devoção estampada no corpo das retratadas, como a que esmalta as unhas com as cores do Vasco. Nair Benedicto foi a Cuiabá, onde presenciou as Olimpíadas Indígenas do Mato Grosso – e seu trabalho é muito mais do que registrar as índias guaranis e o futebol, é um questionamento sobre a exposição do corpo feminino no esporte, desde a ditadura, ela lembra em texto.
Enfim, muitas são as questões – e práticas estéticas – por detrás de um simples tema. “O projeto ultrapassa o fotojornalismo”, diz o curador. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.