Mostra em SP reúne cordéis do pernambucano J. Borges

Na década de 1940, sem rádio e sem televisão, a única forma de se conseguir informação e diversão no agreste pernambucano era pela leitura dos cordéis. Foi nesse ambiente que o então menino José Francisco Borges, natural de Bezerros, começou a se interessar pelos relatos do folclore nordestino e situações do cotidiano da população pobre daquela região que eram publicados em panfletos ilustrados com xilogravuras e vendidos nas feiras locais. “O cordel em mim nasceu desde criança”, conta o autor de cordéis e xilografista, conhecido como J. Borges. Aos 74 anos, os trabalhos e a vida do artista autodidata são tema da exposição “A Arte de J. Borges: do Cordel à Xilogravura”, em cartaz na Caixa Cultural, em São Paulo.

A mostra abrange a produção mais significativa de Borges em mais de 50 anos de carreira artística. São pelo menos 50 trabalhos, entre cordéis, xilogravuras – técnica de gravura em madeira que reproduz imagens e textos em papel – e matrizes originais. Numa área do espaço destinado à exposição na Caixa Cultural, os organizadores tentam reproduzir a oficina da casa do artista, com objetos e fotos dos filhos e aprendizes do cordelista e imagens da cidade natal dele. No cenário, há também uma barraquinha com os panfletos pendurados em cordas – daí vem o nome cordel.

Ainda que o cordelista já tenha participado de exposições em São Paulo e Brasília, entre outras cidades brasileiras, Pieter Tjables, que divide a curadoria da mostra com Tânia Mills, avalia que artistas populares como J. Borges ainda não estão inseridos no circuito de museus brasileiros, ficando sem locais de exposição permanente de seus trabalhos. “É uma arte pouco visível aqui”, comenta Tjables. Otimista, o curador espera que esse “erro histórico” possa ser um dia saldado e observa uma aceitação maior das expressões artísticas populares entre os acadêmicos.

Apostando sempre no humor para mostrar as histórias de sobrevivência, tristezas e alegrias do povo nordestino, aos 21 anos, Borges sentiu a necessidade de ele mesmo ilustrar os seus “gracejos” e, também por conta própria, aprendeu a fazer as xilogravuras. Hoje, ele passa seus conhecimentos para aprendizes e familiares. “Tem artista que acha que ensinar é criar um concorrente, mas eu não acho isso não”, diz ele. “Essa arte, quando eu for, embora, tem de ficar divulgada por muitas pessoas.” Para Tjables, a continuidade dessa arte popular está garantida. “No dia em que o Borges parar ou vier a falecer, nós temos certeza de que o universo dele irá continuar, vivendo através dos familiares dele”, opina.

Borges conta que um cordel pequeno, de oito páginas, consome de três a quarto horas para ficar pronto, mas para publicações mais extensas, em que precisa “criar episódios fortes”, a produção pode levar alguma semanas. “E não é qualquer coisa que dá um cordel”, enfatiza ele. Rigoroso com as regras do cordel, Borges critica cordelistas das novas gerações, que, segundo ele, não respeitam características como as métricas e a rima positiva. “Tem poetas novos que escrevem muita besteira, que não respeitam a rima e são muito fracos de criação.”

Visitas Monitoradas

Para aprender mais sobre o universo de rimas, métricas e xilogravuras, o serviço educativo da Caixa Cultural realiza visitas-ateliês, com jogos e brincadeiras que exploram a obra de Borges, direcionadas a famílias e crianças, aos sábados e domingos, às 10h30 e 14h30. Também aos sábados, das 14h30 às 17 horas, são oferecidas oficinas gratuitas de xilogravura, voltadas a iniciantes e interessados em conhecer a técnica. Há ainda visitas mediadas gratuitas para grupos de até 20 pessoas, que precisam ser agendadas antecipadamente e ocorrem de terça a sexta-feira, às 10, 14, 16 e 19 horas.

A Arte de J. Borges: do Cordel à Xilogravura. Caixa Cultural São Paulo (Praça da Sé, 111, centro). Telefone: (11) 3321-4400. De 31 de janeiro a 28 de fevereiro. De terça a domingo, das 9 horas às 21 horas. Entrada gratuita. www.caixa.gov.br/caixacultural

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