Para celebrar os seus 30 anos de carreira, a artista mineira Valeska Soares ganhou um presente que lhe agradou bastante. Uma grande mostra comemorativa na Estação Pina, em São Paulo, foge do estigma de “exposição retrospectiva”. “Era muito importante para mim que não fosse algo ‘museologicamente’ correto, como acontece em várias instituições”, confessa a artista à reportagem, durante uma visita à mostra Valeska Soares: Entrementes, que fica em cartaz até outubro. “Lidam com a obra da pessoa cronologicamente, parece que ela morreu, parou de trabalhar. Empobrece o olhar.”
A exposição ocupa o quarto andar do prédio e revisita 30 anos de produção, sem linearidade cronológica ou recortes temáticos. Valeska é principalmente prestigiada por suas esculturas, mas pinturas, colagens, instalações e outras experimentações artísticas também estão presentes. Para montar a mostra, a curadora Júlia Rebouças decidiu seguir uma linha sobre uma “dobra” bastante presente na obra da artista, algo entre o limiar do íntimo e o coletivo. “O trabalho da Valeska é enorme. São muitos caminhos possíveis, mas decidi ir na dobra entre a experiência individual e o que é de todos”, explica a curadora.
Em algumas das obras, a tal dobra é literal. Numa série de trabalhos em dupla face, a artista restaurou pinturas a óleo “da burguesia”, que não tinham mais importância para as famílias, e trouxe para o destaque figuras femininas que estavam perdidas. A mulher é tema central também de outros trabalhos da exposição, como uma obra de 1993 inspirada em LOrigine du Monde, de Gustave Courbet, ainda em Para Ana (2017), uma referência à controversa morte da artista cubana Ana Mendieta, numa escultura ao estilo de seu marido, o minimalista americano Carl Andre, absolvido da acusação de seu assassinato pela Justiça dos EUA.
“Valeska nunca se enquadrou como uma artista feminista, mas desde os anos 90 está falando dos incômodos da mulher e de seu lugar”, acredita Rebouças. Para a exposição, ficaram de fora obras com flores, uma das marcas da artista. “Seria um clichê”, afirma. Segundo ela, a própria Valeska também pediu para não incluir os trabalhos com rosas e também as obras com perfume. “Mas em relação ao perfume não resisti e trouxe uma”, brinca a curadora.
Interatividade
Na exposição, os visitantes vão poder interagir com algumas das obras de Valeska Soares. Em Self-Portrait in Denial (2004), esculturas espelhadas refletem sobre a figura feminina. Também com espelhos, Detour (2002), obra inspirada no conto As Cidades e o Desejo, do escritor italiano Italo Calvino, traz um mesmo sonho compartilhado por cinco diferentes narradores, que buscam uma mesma mulher. “Quis recortar essas falas e criar uma outra, labiríntica. A história nunca fica igual”, diz a artista.
Uma das três salas expositivas abriga duas das maiores obras da mostra. Vaga Lume (2007) é sucesso entre visitantes. “Um cara já passou horas até escrever I Love You entre as luzes”, relembra Valeska aos risos. Epilogue (2017), com suas várias mesas bem servidas de taças e bebidas, também chama a atenção.
VALESKA SOARES: ENTREMENTES
Pina_Estação. Largo General Osório, 66. Tel. 3335-4990. 4ª a 2ª, 10h/18h. Gratuito. Até 22/10.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.