As biografias de Michael Jackson podem discordar em pontos obscuros, como a relação com os filhos e sua vida de Peter Pan na mansão Neverland, mas todas dançam o mesmo passo quando abrem parágrafos para Joseph Jackson: antes de qualquer atributo profissional, ele era um monstro. Apenas uma das passagens da infância do pequeno Michael nos preparativos daquele raiar de 1964, ano em que faria 6 anos de idade, ainda no tempo dos Jackson Brothers, anterior ao Jackson 5: Michael entra em casa e não vê o pai escondido atrás da porta. É surrado por trás, cai e apanha mais, mesmo caído e sem saber o motivo. Ele pergunta ao pai o que o levou a ser atacado e apenas ouve: “Você ainda não fez nada, mas vai fazer”. Este era Joe Jackson.

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As torturas não eram apenas físicas. Joe, por estratégia ou raiva, se tornou um especialista em triturar o ego do filho antes que ele nascesse. Os xingamentos inspirados na largura de seu nariz eram agressivos e fariam Michael buscar pelo afinamento de seu perfil pelo resto da vida. Até que ficasse claro para o menino de 5 anos que não havia hora de brincar, mas apenas ensaiar para o grande dia prometido para os Jacksons, há relatos de Michael apanhando de chicote e madeira. Este era Joe Jackson.

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Joseph usava a história a seu favor. Afinal, gostando ou não, sua estratégia havia dado certo. Ao todo, Michael, o pequeno mais notável da música pop, venderia, apenas com o Jackson 5, 113 milhões de discos. E sem aparecer no programa do apresentador Ed Sullivan, completamente inebriado pelo garoto que acabara de conhecer, com algum hematoma que justificasse as acusações de agressão doméstica.

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A habilidade do pai com os negócios era reconhecida por Michael Jackson na mesma intensidade com a qual o rei do pop se sentiria eternamente órfão: “Ele era um assessor brilhante, mas o que eu realmente queria era um pai”. Em 2012, Katherine, mãe de Michael, se separou do marido alegando que Joe se tratava de um “mulherengo” interessado apenas na fortuna deixada pelo filho. Fazia sentido. Jackson morreu com um testamento pronto, ignorando o nome de Joe como herdeiro. “Só de pensar nele, eu sinto ânsia de vômito”, dizia o filho.

O pai que precisa cobrar dedicação do filho para que ele não deforme um projeto iniciado na infância não tem paralelos aparentes nem na terra do nunca da qual surgiu Michael Jackson. Vernon Presley, pai de Elvis, sujou a ficha apenas uma vez. Quando o filho tinha 3 anos, passou oito meses encarcerado. Motivo: falsificou cheques. Jim McCartney, pai de Paul, trabalhou duro vendendo algodão. Foi premonitório trazendo um instrumento para Paul, mas errou na espécie: trompete. Stanley Dwight, pai de Elton John, foi o Joe Jackson ao contrário. Seu descaso era tanto com o pequeno Reginald que ele morreu sem jamais ter assistido a um concerto do maior pianista da música pop.

Quando sentiu a morte batendo à porta do quarto do hospital onde aguardava o câncer iniciado no pâncreas terminar de fazer seu trabalho, Joe Jackson, 89 anos, proibiu os filhos de entrar naquele ambiente. Por quatro dias, a família argumentou com os médicos em vão até que, finalmente, foram liberados para se despedir de Jackson pai, declarado morto nesta quarta, 27. Suas últimas palavras pareciam profundas: “Eu vi mais pôr do sol do que me resta para ver. O sol nasce quando chega a hora e, se você gosta ou não, o sol se põe quando chega a hora”. Paris Jackson, herdeira de Michael, ficou indignada. “Não sei quem estava usando a conta do Twitter do meu avô. O post é lindo, mas não foi ele quem escreveu.” Esse não era mesmo Joseph Jackson.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.