Morre Viotti, maestro da nova geração

São Paulo – Os cargos que já ocupou – direção da Orquestra da Rádio da Baviera e do La Fenice, de Veneza -, assim como sua agenda para os próximos meses – produções no Festival de Salzburgo e no Metropolitan de Nova York -, são provas suficientes de que Marcello Viotti vivia um momento importante da carreira, solidificando seu nome em meio à geração de maestros que aos poucos substitui os grandes nomes do passado. Mas, aos 50 anos, uma parada abrupta: ele morreu na noite de quarta-feira em decorrência de um derrame sofrido na semana passada, durante os ensaios de uma produção de Manon, na Ópera de Munique. Era casado e deixou três filhos.

No verão europeu, Viotti iria reger uma nova produção da Traviata, de Verdi, em Salzburgo. O festival austríaco sempre foi sinal de prestígio para um regente. E sua Traviata seria a soprano russa Anna Netrebko. Ela é a grande estrela da ópera no momento e essa montagem foi pensada desde o início como um veículo para ela. Tem tudo para ser o ponto alto da programação. E diz muito sobre a receptividade do trabalho de Viotti ter sido ele o escolhido para regê-la. O que está em pleno acordo com o excelente trabalho que ele vinha desenvolvendo no campo operístico.

Filho de pais italianos, Viotti nasceu em Lausanne, onde iniciou seus estudos. Alguns anos mais tarde, assumia o coro da prestigiada Suisse Romand, na época dirigida por Wolfgang Sawallisch. Foi ele o responsável por encaminhar o jovem regente para o mundo do teatro – em pouco tempo, trabalharia como pianista na Ópera de Turim, onde, mais tarde, seria principal regente convidado e assistente do maestro Giuseppe Patané. Assumiu a Ópera de Lucerna, foi diretor musical da cidade de Bremen, regente titular das orquestras das rádios de Saarbrückenb e Leipzig.

A grande oportunidade, aquele momento em que a promessa vira realidade, ocorreu em 1990. Foi quando substituiu em cima da hora o maestro Riccardo Muti à frente de um concerto com a toda-poderosa Filarmônica de Berlim. A década de 90 começava bem para ele que, nos anos seguintes, marcaria presença nas principais casas de ópera do mundo. Especialista na obra do francês Jules Massenet, participou de montagens históricas na Ópera de Viena: em 95, montou Herodíade com Plácido Domingo e Agnes Baltsa; e, no ano passado, resgatou Roi de Lahore, utilizando uma nova edição crítica da partitura que ele mesmo ajudou a preparar.

Na música sinfônica, ele também deu passos importantes, como concertos com as filarmônicas de Viena e de Nova York, com as quais tinha contratos para apresentações nos próximos anos. À frente da Orquestra Sinfônica da Rádio da Baviera, onde ficou de 1998 até o ano passado, criou uma série chamada Paradisi Gloria, dedicada à música sacra produzida no século 20. Era esse o repertório que, nas salas de concertos, mais o agradava. Da mesma forma que, nos palcos de ópera, ganhou boa reputação como intérprete dos repertórios italiano e francês. E foi nesse universo que suas gravações o distinguiram entre seus colegas.

Num período em que se grava muito pouca ópera, por causa da crise por que passa a indústria fonográfica de música clássica, ganham ainda mais importância projetos como a Favorite, de Donizetti, ou a Gioconda, de Ponchielli. Fez uma gravação de referência da versão francesa da ópera de Donizetti, com um elenco que incluía o tenor mexicano Ramón Vargas e a meio-soprano búlgara Vesselina Kasarova. Já para a Gioconda, de 2003, reuniu Plácido Domingo e Violeta Urmana e fez da gravação um documento importante, seja pela presença de Domingo seja pelo exímio conhecimento no trato da música dramática, seja pela capacidade de trabalhar com a voz, características que estão também na série de recitais de árias de ópera gravada com cantores como Roberto Alagna, Vargas ou Rolando Villazón. Estamos numa época que toda uma série de jovens cantores procura seu lugar ao sol no mundo da ópera – Viotti era o maestro deles. Outras gravações incluem peças menos conhecidas, como Cristoforo Colombo, de Franchetti, e o Roi Arthur, de Chausson. No campo sinfônico, destaque para a integral das sinfonias de Schubert.

Mais recentemente à frente do restaurado La Fenice de Veneza, articulava uma série de projetos, como as óperas de Mozart e Wagner, em parceria com outros teatros e festivais como o de Salzburgo. Após o incêndio que derrubou o La Fenice na década de 90, Viotti foi o homem escolhido para reerguer o teatro e devolver a ele o prestígio de um espaço que já foi até palco de estréias de óperas de Verdi. 

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