Se você gosta de western spaghetti, há de se lembrar de Tuco, o mexicano, que ao lado de Clint Eastwood e Lee van Cleef, eram Os Três Homens em Conflito, título brasileiro desse emblema do gênero, dirigido por Sergio Leone em 1966. Tuco era interpretado por Eli Wallach, que morreu nessa terça-feira, 24, aos 98 anos. Neste filme, ele usava uma técnica especial. Fazia o malvado ficar engraçado, puxando o tipo mexicano em direção a uma caricatura que se auto-parodiava. Visto de perto, era trabalho de um grande ator, e Eli era dos melhores.
De certa forma, no imaginário do público, ele ficou preso a esse papel, ou alguns similares, embora tenha interpretado quase duas centenas de personagens ao longo de uma extensa carreira. Dos filmes mais conhecidos em que figura no elenco, podem-se citar Sete Homens e um Destino, A Conquista do Oeste e O Poderoso Chefão 3.
Mas na verdade, Wallach, nascido em Nova York em 1915, trabalhou até idade avançada, tendo integrado o elenco de Wall Street: o Dinheiro Nunca Dorme, crítica de Oliver Stone à especulação financeira. Uma longa vida – uma das suas últimas participações é de 2010, em O Escritor Fantasma, de Roman Polanski.
Se na memória dos cinéfilos sua imagem ficou presa ao do homem mau inventado por Sergio Leone, era, na verdade, muito mais versátil. Era conhecido como ator pau para toda obra exatamente pela plasticidade com que aplicava o “Método”, aprendido no Actor’s Studio, de Lee Strasberg, que revolucionou o cinema e o teatro norte-americanos no pós-guerra. Foi colega de Marlon Brando, Montgomery Clift, Sidney Lumet. Brando e Clift logo conheceram o estrelato. Já o tipo de Wallach, em métier tão dependente da beleza física, o empurrava para papéis secundários e, na maior parte das vezes, vilões.
Diferente era no teatro, palco em que Wallach podia tocar toda a extensão de sua gama dramática, sem os entraves mercadológicos de Hollywood. Por isso, costumava dizer, com bom humor, que tinha “vida dupla”. Numa, era o eterno vilão do cinema; noutra, o ator escolhido para viver personagens sofisticado. Wallach, no meio teatral nova-iorquino, tinha reputação de ótimo intérprete de Tennessee Williams, Eugène Ionesco e Tom Stoppard, entre outros autores.
Mas essa é a cena teatral, que, embora cosmopolita, não viaja, ou viaja com menos facilidade e frequência que o cinema. Inevitavelmente, Wallach torna-se conhecido por sua atuação na tela. E, nesta, foi mais limitado, pelo menos em aparência.
Mas, mesmo em termos de cinema, se pensarmos bem, Wallach criou personagens matizados. Por exemplo, em O Poderoso Chefão 3, na parte da Sicília, faz um inesquecível Dom Altobello, o mafioso veterano, cheio de sabedoria, que se envolve na luta do angustiado Michael Corleone (Al Pacino) contra facções locais e o poder do Vaticano. Como tantas outras figuras secundárias, escolhidas a dedo por Francis Ford Coppola, Wallach contribui com seu tanto de talento e refinamento para que o resultado se torne nada menos que uma obra-prima da história do cinema.
Lembramos com facilidade do homem mau, mas esquecemos outras de suas facetas, Além de Dom Altobello, Wallach foi Guido, que, em Os Desajustados, de John Huston, dança com Marilyn Monroe em seu último filme.
Wallach fez cinema, telefilmes, séries, peças de teatro. Foi ator completo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.