Morreu neste sábado o cartunista Paulo Caruso, aos 73 anos. Meu primeiro contato com o trabalho dele foi na adolescência, nas páginas do jornal O Pasquim. Alguns anos depois, na faculdade de comunicação social, quando me transformei em um ávido leitor de jornais e revistas semanais, ficamos mais íntimos, pois as publicações sempre vinham recheadas com suas caricaturas, HQs, charges e cartuns.
Paulo nasceu em São Paulo, em 6 de dezembro de 1949, irmão gêmeo de Chico Caruso, também cartunista. Cursou arquitetura na USP, mas não exerceu a profissão. Sua paixão eram os cartuns. Com uma carreira extensa, com passagens também por esta Folha, Paulo agora fazia charges no Roda Viva, da TV Cultura.
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Paulo estava internado no hospital Nove de Julho, na capital paulista, há cerca de um mês, para tratar das complicações decorrentes de um câncer no intestino. A família pediu que ele fosse desentubado para receber os amigos na manhã deste sábado, mas ele não resistiu.
Minha história com Paulo começa em 1993, quando fui morar em São Paulo e me tornei amigo de Angeli. Todos os sábados, a gente comia no restaurante Urca, ao lado do Fórum de Pinheiros. Em um desses almoços, apareceu o Paulo na porta do lugar. Discretamente, perguntei a Angeli: “Aquele lá é Paulo ou Chico?”.
São necessários uns quatro encontros, no mínimo, para ser possível distinguir os gêmeos. “É o Paulo!”, respondeu Angeli, acenando para ele. Acabamos almoçando os três juntos e depois fomos tomar um café no Fran’s da Fradique Coutinho. No final da baladinha, trocamos telefones.
Alguns dias depois, para minha surpresa, ele me ligou. Confesso que não esperava. Paulo Caruso estava me convidando para um show de sua banda, a “Muda Brasil Tancredo Jazz Band”, que contava com Chico, Cláudio Paiva e Luis Fernando Verissimo. Só craques no palco, e eu estaria presenciando este encontro musical.
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Não levou muito tempo para nos tornarmos amigos próximos e, como éramos vizinhos, sempre marcávamos de nos encontrar. Eu não era mais íntimo de seu trabalho, apenas. Era também parte de seu círculo de amigos mais chegados.
Ele gostava de pessoas em volta, bom papo, de preferência regado por um bom vinho e carne. Por isso, nosso ponto de encontro era a churrascaria Leôncio, na rua Girassol. Paulo era querido por todos no lugar, do garçom ao proprietário. Cumprimentava todo mundo, fazia piadas com sua voz de locutor de rádio e, principalmente, desenhava caricaturas incríveis nos guardanapos. Não me considero alguém simples de caricaturar, mas Paulo não teve dificuldade alguma e foi um dos poucos que conseguiu reproduzir meus traços no papel.
Ao completar 33 anos, resolvi festejar meu aniversário e o convidei. Paulo e sua esposa foram os primeiros a chegar à pequena vila em que eu morava, na rua Fernão Dias, atrás do Largo da Batata.
“Tem que comemorar, afinal é a idade de Cristo!”, ele brincou. Em seguida, me entregou um envelope A4 e disse que era “material de imprensa”. Eu estava tão envolvido com a festa, que esqueci de abrir o envelope.
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Uma semana depois, ele me ligou e perguntou se eu tinha aberto o envelope. Mas qual envelope? Imediatamente, caiu a ficha e lembrei. “Paulo, desculpa, deixei na minha estante e esqueci completamente. Vou abrir e te ligo depois”, eu respondi.
Pedi desculpas de novo, envergonhadíssimo. Desliguei o telefone e fui em busca do tal presente. Procurei na casa inteira e nada. Morrendo de vergonha, não retornei a ligação. Uma semana depois, a faxineira encontrou um envelope atrás da geladeira e me entregou. Era o famoso envelope.
Abri e meus olhos brilharam: à minha frente estavam dois originais aquarelados espetaculares, customizados especialmente para mim. Um artista de talento raro e uma pessoa tão gentil. Bonachão. Seu sobrenome deveria ser esse. Que falta você vai fazer, Paulo Bonachão Caruso.
Colaborou: Luciano Veronezi