Monólogo marca volta de Fernanda Montenegro ao teatro

Um único facho de luz ilumina a atriz sentada em uma cadeira, destacando sua camisa social branca, uma calça preta mas, sobretudo, seus grandes e hipnotizantes olhos. Durante aproximadamente uma hora, Fernanda Montenegro empresta o corpo ao monólogo Viver sem Tempos Mortos, que estreia amanhã para convidados e no sábado para o público, no Teatro Anchieta do Sesc Consolação, em São Paulo.

Trata-se de uma montagem que se destaca em sua carreira de seis décadas. Sem maneirismos nos gestos ou na voz, Fernanda limita os movimentos para concentrar nas falas a narração de uma série de reflexões sobre a vida e a obra de Simone de Beauvoir (1908-1986), a filósofa e escritora francesa, que se transformou em ícone do feminismo e parceira de outro célebre pensador, Jean-Paul Sartre.

“O privilégio está em ouvir a palavra”, diz ela, com aquela voz que se tornou característica graças ao timbre e à facilidade com que é modulada. “O (diretor) Felipe Hirsch fez várias experiências de cenário até descobrir que nenhum elemento em cena é mais importante que o discurso de Simone.”

Longe dos palcos desde 2001, quando encenou Alta Sociedade, a atriz retorna na pele de uma das pensadoras mais influentes do século 20. No palco, Fernanda não interpreta Simone de Beauvoir, mas uma espécie de porta-voz, que também discursa em primeira pessoa. Inicialmente, a atriz planejava dividir a cena com o ator Sergio Britto, no papel de Sartre. Mas logo ele estreou A Última Gravação de Krapp/Ato sem Palavras 1, em cartaz no Sesc Santana, e abandonou o projeto.

“Sergio Britto ficou nos braços do Beckett e eu, nos da Simone”, brinca ela. “O projeto nasceu de uma vontade de trabalharmos juntos, mas como o acaso criou ali uma separação, eu não quis desperdiçar as várias horas de leitura e envolvimento. E, novamente o acaso me fez encontrar um patrocinador, a Mapfre, que tinha justamente a intenção de apostar em um projeto cultural educacional teatral para zonas menos favorecidas.” Viver sem Tempos Mortos faz parte do projeto ‘Caminhos da Liberdade’, que inclui palestras, documentários, debates, exposições e livros.