Do lado de fora, o trânsito na região da Oscar Freire, zona oeste de São Paulo, tira o humor de qualquer um que circula pela cidade, mas nada parece afetar o sorriso de Mônica Martelli. No apartamento recém-alugado, a atriz e autora carioca não esconde um entusiasmo quase adolescente diante da expectativa da temporada de três meses que fará com o espetáculo Minha Vida em Marte, que estreou sexta-feira, 17, no Teatro Procópio Ferreira. “Já me sinto paulistana”, brinca.
Sua passagem pela capital trouxe mudanças na rotina de toda a família: Julia, a filha de 8 anos, e a cachorrinha de estimação também vieram. Nas paredes, alguns quadros pintados pela menina adornam o novo ambiente. Artes plásticas seria uma boa carreira, aponta a mãe. E a televisão? Mônica muda o sorriso para uma expressão de preocupação. “Não gosto muito dessa ideia de criança trabalhando na televisão. O ritmo é muito cansativo. No teatro talvez, ou em filme. Aliás, ela vai aparecer no meu novo filme.”
Minha Vida em Marte – O Filme chega aos cinemas só em dezembro, mas o público paulista poderá acompanhar a história na peça que retoma a vida de Fernanda. No Rio, os mais de 100 mil espectadores já conhecem a comédia. Minha Vida em Marte é a continuação da saga da personagem criada em 2005 quando Mônica lançou a comédia Os Homens São de Marte…
E é Pra Lá Que Eu Vou. Na história, ela é uma jornalista formada que trabalha como organizadora de festas de casamentos. A proximidade de sua atividade com o ideal romântico do matrimônio, dos casórios que realiza, ajuda a sacudir a rotina de uma mulher que só quer se apaixonar. Para Mônica, Fernanda foi um passo mais que essencial em sua carreira.
“Naquele momento, eu já estava na televisão, em participações ou em projetos dos outros. O que eu buscava era um projeto meu. Comecei a escrever algumas coisas, mas havia certa insegurança. Quando terminei o texto, vi que a história só seria engraçada se eu contasse.” A mãe de Mônica foi quem deu a dose de confiança que faltava. “Ela disse: pegue um caixote, suba em cima, e fale para o mundo ouvir.”
O “caixote” da vez foi o Teatro Cândido Mendes, em Ipanema. “Minha irmã, Susana, que é a diretora, encontrou o teatro, reservamos para a temporada e até o dia da estreia, eu não imaginava o que ia acontecer.”
De fato, sua preocupação é legítima. Em São Paulo, a diversidade de produções ofertadas em diferentes espaços teatrais fomenta todo tipo de público, de forma quase espontânea. No Rio atual, ela conta que o “boca a boca” costuma funcionar mais, para o mal e para o bem. “Percebi que a peça ia virar um sucesso quando minha irmã disse que eu ia precisar fazer uma segunda sessão no sábado. Os ingressos estavam esgotados, mas havia muita gente esperando.”
E ela não conquistou apenas a admiração do público. A crítica carioca Barbara Heliodora (1923-2015), temida pelos artistas por seu rigor e sua escrita sincera demais, elogiou o monólogo. “Ela abraça a plateia com sua simpatia, e esta a abraça com sua solidariedade, com seu apoio”, escreveu Barbara em 2005. A boa recepção do espetáculo também apareceu nos prêmios de teatro. “Fui indicada em todos, mas não ganhei nenhum”, dispara. “Porque há preconceito com espetáculos de humor.”
De 2005 para frente, 2,5 milhões de espectadores se divertiram com a Fernanda e sua busca pelo amor. Números raríssimos desejados por todo artista brasileiro que busca se comunicar. E, em geral, as comédias são os veículos de sucesso para levar mensagens universais, basta lembrar de Trair e Coçar É Só Começar, de Marcos Caruso, que é a terceira peça no mundo em cartaz ininterruptamente. “Não adianta nada o artista se divertir sozinho”, diz Mônica. “O pública percebe.” No momento em que se discute a moralidade de uma piada, Mônica explica o funcionamento de seu espetáculo. “Eu não conto uma piada e você vai rir do início ao fim.”
Toda a maturidade conquistada pela atriz e sua personagem em Os Homens São de Marte… chega em Minha Vida em Marte com o desafio de viver em família. Agora Fernanda está com 45 anos, casada há 8 e com uma filha de 5. Suas aventuras em busca de encontrar um amor foram substituídas por uma crise conjugal, vulgo a perda do romantismo, a falta de tesão e a diminuição do afeto. “Depois da minha separação, precisei de um bom tempo para encarar minha própria vida, revê-la e conseguir escrever essa nova história.”
A facilidade com que Mônica fala publicamente de suas emoções e sentimentos tem a ver com o entendimento de que a mulher contemporânea deve se tornar dona de sua história. “Fomos reprimidas desde sempre. Hoje lutamos, por exemplo, para que o mercado não veja a maternidade como um problema. Amamentar é a mesma coisa.” Ela lembra que a mãe foi vereadora em Macaé, no Rio, e não havia banheiro feminino na Câmara. “Ela levava um pinico e deixava em cima da mesa, como forma de protesto.”
Nos próximos três meses, a nova paulistana também se prepara para o lançamento do filme de Minha Vida em Marte, mais uma vez ao lado de Paulo Gustavo, que estrelou com ela no primeiro longa. “A gente é muito agitado junto. Você precisa ver quando fazemos reunião. Tem gente que não acompanha.”
Do lado de fora do apartamento, o trânsito não dá trégua. Nem o sorriso de Mônica.
MINHA VIDA EM MARTE
Teatro Procópio Ferreira.
R. Augusta, 2.823. Tel.: 3083-4475. 6ª, 21h30, sáb., 21h, dom., 18h. R$ 100 – R$ 120. Até 22/12.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.