A decisão foi radical: tão logo foi convidada a viver a principal personagem do musical Rita Lee Mora ao Lado, que estreia nesta sexta-feira, 4, no Teatro das Artes, a atriz Mel Lisboa iniciou uma verdadeira imersão. Voltou a morar em São Paulo, desistiu de participar de uma novela de TV (Pecado Mortal, na Record), tratou de um calo nas cordas vocais e ainda iniciou curso intensivo de canto e fono. Foram dois meses e meio de preparação para, enfim, conseguir reproduzir (sem caricatura) a grande dama do rock nacional.
“Eu me desliguei de tudo o máximo que pude e só pensava na Rita”, conta ela, que conseguiu captar as principais características da cantora, como sua expressão corporal durante os shows, o sorriso matreiro, a coçada de cabeça. “Busquei ser real em tudo, a ponto de não usar peruca: tingi meus cabelos e deixei o mesmo corte de franja que ela”, conta Mel, que teve um encontro com a própria Rita Lee.
Foi durante uma sessão de autógrafos do livro que a cantora dividiu com o cartunista Laerte, Storynhas (Companhia das Letras), no mês passado. “Fui com o elenco e foi fundamental”, lembra. “Rita foi doce, conversou com todos e, depois, me enviou um e-mail de apoio.”
A história do musical Rita Lee Mora ao Lado, no entanto, é longa. Nasceu há cinco anos, quando o diretor e produtor Márcio Macena decidiu montar um espetáculo do gênero. Empolgado com o livro intitulado justamente Rita Lee Mora ao Lado (Panda Books), de Henrique Bartsch, decidiu que seria sobre a cantora. “Contatei Henrique, que também ficou empolgado com a ideia”, conta Macena.
Mas, quando os planos progrediram, Bartsch morreu, em 2011, vítima de enfarte. Macena não se sentiu à vontade para continuar o projeto e o deixou de lado. “Mantive contato com a família dele e foram eles que me incentivaram a retomar o plano”, diz Macena, que se uniu a Débora Dubois para dividir a direção.
O musical mantém a estrutura dramática do livro – ao invés de relatar as histórias de Rita Lee, Bartsch seguiu os conselhos da cantora (de quem se tornou muito amigo) e não escreveu uma biografia convencional. Preferiu inventar um personagem, que acompanharia toda a trajetória de Rita, funcionando como um grilo falante.
Surge, então, Bárbara Farniente (Carol Portes), garota que é vizinha de Rita Lee e com quem divide momentos da infância e adolescência, sempre não escondendo a inveja. A mãe de Bárbara, Diva (Nanni Souza), na verdade, sempre foi apaixonada por Charles Lee Jones (César Figueiredo), pai da futura cantora, e, como não foi correspondida, passa a vida a espionar a família Lee, que mora ao lado.
“É o momento para contarmos fatos da vida de Rita e, como não poderia ser diferente, é a chance de mostrar como ela sempre foi uma moleca. Assim, surge a menina que fez xixi nos sapatos da turma enquanto todos estavam fora”, conta Macena que, ao lado de Débora Dubois, fez a seleção de canções – a primeira seleção apontou 130 músicas, que foram reduzidas para 70 até chegar às 39 que constam no espetáculo.
“Nossa intenção foi utilizar a trilha como complemento da história, mas sem se prender à cronologia”, conta Macena.
Assim, em cena surgem clássicos como Agora Só Falta Você, Saúde, Banho de Espuma, Caso Sério, Menino Bonito, Panis et Circensis, Ando Meio Desligado, entre outros. Para compor o panorama da época – afinal, Rita e seus contemporâneos se alimentaram de outros estilos -, o elenco também apresenta músicas dos Beatles, Elis Regina, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Ray Charles.
Também as pessoas com quem a cantora conviveu despontam no musical, oportunidade para interpretações curiosas – Débora Reis, por exemplo, oferece uma divertida Hebe Camargo e seu sorriso infindável, assim como Fabiano Augusto que, conhecido como garoto propaganda das Casas Bahia, preocupa-se em mostrar sua versatilidade e compõe um inspirado Ney Matogrosso.
O grande destaque, no entanto, é Mel Lisboa – sua atuação vence o perigoso risco de se resumir à uma caricatura graças ,às sutilezas de sua performance, valendo-se de alguns recursos de atuação para fazer o público saber que ali está Rita Lee. “Mel trabalhou profundamente e, como a Rita, mostrou ser uma mulher que acredita no seu trabalho, independente do que pensam as pessoas”, diz Macena, que aguarda, agora, a presença da própria Rita. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.