Fotos de Sérgio Guerra
e que estão em exposição.

Nas centenas de banquinhas distribuídas pelas ruas do Mercado São Paulo, vende-se de tudo um pouco: raízes, temperos, tecidos, velas, peixes, carne de boi, porco e carneiro, aves, roupas, cestos, moringas, esculturas. Uma lista quase infindável. Nas centenas de banquinhas distribuídas pelas ruas da Feira de São Joaquim, vende-se de tudo um pouco: raízes, temperos, tecidos, peixes, carne de boi, porco e carneiro, aves, roupas, cestos, moringas, esculturas. Uma lista quase infindável. Um fica em Luanda; a outra, em Salvador.

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Mesmo separadas pelo Atlântico, as duas feiras fazem uma nítida ponte entre as culturas de Brasil e Angola, ainda incrivelmente identificadas mesmo depois de quase cinco séculos de história. Esta profunda identidade será revelada na mostra Lá e Cá, do fotógrafo brasileiro Sérgio Guerra, que apontou suas lentes para dois dos mercados livres mais populares de cada país. O local escolhido para sediar a mostra não foi o ambiente ascético das galerias de arte, mas sim o próprio espaço caótico e multicolorido da Feira de São Joaquim, que a partir de 18 de janeiro e durante um mês abrigará, em meio aos seus 34 mil metros quadrados, a megaexposição de 438 fotografias. Em junho, será a vez dos angolanos conferirem o trabalho no Mercado São Paulo.

Logo na entrada da feira, um enorme painel de 120 metros quadrados (3 x 40m) será o primeiro sinal da exposição. No interior do mercado, as mais de quatro centenas de fotos coloridas e em preto e branco, em tamanhos variados (20x30cm, 30x40cm, 50x75cm, 80x100cm e 100 x 150cm), estarão distribuídas em paredes, fachadas e nos boxes dos feirantes, e receberão iluminação especial, destacando os trabalhos do cenário onde estarão inseridas.

A mostra é o ponto de partida de um projeto que inclui também o lançamento de produtos derivados livro, como cartões postais, calendários, camisetas que darão uma maior longevidade ao trabalho, bem como a possibilidade de ampliar sua divulgação, valorizando ainda mais a importância histórica e cultural dos dois mercados. O livro conterá uma seleção representativa das imagens expostas, ao lado de uma série de textos que citam as duas feiras. Entre eles, trechos de obras de autores angolanos, como Pepetela e Óscar Ribas, e letras de músicas brasileiras (Gilberto Gil e Capinan) e angolanas, além de depoimentos dos feirantes angolanos e baianos. Estes últimos reivindicam a posse definitiva do terreno, causa que sensibilizou o fotógrafo.

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Além dos traços culturais em comum, da mesma língua ouvida em seus corredores e dos santos católicos que dão nome às duas feiras, o que mais impressionou o fotógrafo foi a incrível semelhança das pessoas, não apenas fisicamente, mas também quanto ao porte, apresentação e comportamento. ?Muitas vezes é impossível dizer de imediato onde exatamente uma determinada foto foi captada, se no Brasil ou em Angola?, admira-se Guerra. Ambas foram ainda marcadas por tragédias que motivaram a mudança dos antigos para os atuais nomes: em 1948, o desabamento de uma grande laje destrói o Mercado Xamavo. Reconstruído, passa a se chamar Mercado São Paulo. Em 1964, é a vez da Feira de Água de Meninos, em Salvador, ganhar o nome de São Joaquim depois de ser arrasada por um incêndio.

Mais do que um simples registro da forte união entre as duas culturas, a exposição promove um encontro real entre elas. Ao escolher como sede os próprios cenários onde suas imagens foram captadas, a mostra estará literalmente apresentando uma feira à outra. ?Quis valorizá-las enquanto espaços culturais, atraindo um público que normalmente não conhece ou freqüenta aqueles universos?, explica o fotógrafo. ?Minha intenção foi também resgatar a sabedoria popular preservada neste espaço, homenageando e retribuindo às comunidades de São Paulo e de São Joaquim uma imagem positiva do seu trabalho e do seu papel social, sobretudo de resistência, ao manter suas tradições ao longo do tempo e apesar de todas as dificuldades?, resume Sérgio Guerra. E finaliza: ?Ainda é tempo da sociedade rever as coisas e encarar o desafio de oferecer à comunidade da feira mais oportunidades, já que os feirantes mantêm um patrimônio da cidade?.

Serviço:

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Exposição Lá e cá – Abertura: 18 de janeiro, às 11h. Até o dia 19/02 – Entrada franca – Feira de São Joaquim – Salvador. Av. Frederico Pontes, s/n.º – Entrada principal .