Máximas (mínimas), epigramas (desgramados) e aforismos mais ou menos desaforados

Abrir certos livros é descerrar novos mundos. Mais do que metafísica de tolos, a superstição talvez seja pseudo-religião de imbecis. Quantos historiadores não foram admiráveis ficcionistas, mesmo escrevendo história? Se o nascimento dá a vida, a educação dá sentido à vida. A liberdade está para a cidadania, assim como o oxigênio está para os pulmões. No livro imortal, não são Dom Quixote e Sancho Pança que dialogam. É Cervantes que fala consigo mesmo. "Através da arte, o homem não apenas se ultrapassa", como escreve Simone de Beauvoir, "mas se transcende, chegando a tangenciar a própria divindade". A pressa pode ser inimiga da perfeição, mas é amiga fraterna da virtude dos reis a pontualidade. As piores mentiras são as que merecem crédito à vista ou a prazo. "Pecunia non olet. Dinheiro não tem cheiro", dizia Vespasiano. Mas quanto mau cheiro ele não provoca, às vezes! Tenho uma grande esperança: a de nunca perder a esperança. Certas lembranças dolorosas não passam de ferrugem no metal da memória. Não será a esperança uma espécie sutil de saudade do futuro? Só existe uma coisa que se aproxima, tangencia ou chega mesmo a identificar-se com a felicidade: o amor. O trabalho de Hércules do ocioso é não fazer nada e procurar sempre fazer cada vez menos. Todos os "ismos" religiosos do mundo, cristianismo, judaísmo, islamismo, budismo, bramanismo, xintoísmo, etc. se concentram e confundem num só: humanismo. O melhor professor é aquele que acaba por fazer do aluno seu mestre. O progresso tecnológico promove uma grande metamorfose: transforma homens livres em servos de máquinas e apertadores de teclas. Para procurar e descobrir o seu pior inimigo, alguns homens não precisam ir longe de casa: basta que olhem no espelho. A indiscutível paternidade do professor em relação ao aluno, se não é biológica, é pelo menos gnosiológica ou teleológica. Qual a coisa mais cara que existe? O dinheiro. Como custa ganhá-lo, como é difícil obtê-lo! *** Para quem tem fé, a esperança talvez seja supérflua. A corrupção é uma espécie de dermatose ou pior, lepra do caráter. Não seria o caso de falar em leprosos morais? Se, para Mário da Silva Brito, o absurdo é o mistério dos incrédulos, e para Ledo Ivo, é o sal da vida, para mim, que gosto de mistérios e abuso do sal, o absurdo é simplesmente absurdo. Teria porventura Jefferson se inspirado no Dr. Johnson quando escreveu esta enormidade: " Tremo pela minha pátria quando penso que Deus é justo! Há uma diferença fundamental entre líderes e chefes: estes são obedecidos, às vezes de má vontade e com a cara amarrada; os outros são seguidos, alegremente". A felicidade talvez seja uma alegria tão grande, um prazer tão intenso, que só pode ser provisória, intermitente, esporádica. Se permanente, constante, seria mortal. Envelhecer exige ciência e consciência. Já saber envelhecer é uma arte. Às vezes, tão importante como solucionar problemas, é problematizar as soluções. A verdade nada tem de pudica ou digestiva: está sempre nua e crua. Saber o que se ignora e o que se pretende conhecer, eis aí um dos princípios da sabedoria. Nos caminhos da vida, é sempre melhor tropeçar em pedras drummondianas ou não do que cair em buracos ou despenhar-se em abismos. É melhor ignorar por inteiro do que saber pela metade. De quantos crimes, desonestidades e ignomínias não se fez a glória de alguns homens que depois de mortos viraram estátuas? A escola é templo; o professor, sacerdote; a educação, liturgia transformadora, se não transfiguradora. Toda a fauna de vaidosos e gabolas lembra os tambores marciais: fazem muito barulho, mas são ocos por dentro. Os motivos mais justos para fazer uma guerra não a tornam menos injusta. Da mesma forma que o homem é uma célula da humanidade, esta talvez seja um átomo do corpo de Deus. A lágrima é mais versátil que o riso. Afinal, nós podemos chorar de alegria, mas não rir de tristeza. Para a criança, duas palavras se equivalem, no seu valor semântico: Deus e mãe. Até imperadores, reis e presidentes são servos da consciência se a têm e escravos da ortografia, da morfologia e da sintaxe. Um grande romance não é apenas vida imitada, copiada, inventada, recriada, mas vida autêntica, feita do sangue do verbo elementar. São sete os pecados arrolados no catecismo católico. Seria bom acrescentar mais um: a ingratidão. É bom, em certos momentos, pensar com o coração e sentir com o cérebro. Há livros cujo desconhecimento nos deixaria irremediavelmente mais pobres. Só sei que nada sei: assim falou Sócrates. O maior mentiroso da história? Mais vale uma esperança na mão do que dois sonhos voando. Feliz aquele que soube tornar-se homem de bens sem deixar de ser homem de bem. Até os erros de alguns filósofos e os equívocos de certos pensadores do passado foram mais luminosos e iluminantes do que muitas verdades corriqueiras. O professor é o mais importante dos arquitetos. Só que, em vez de casas, prédios, torres, constrói cidadãos.

João Manuel Simões é poeta e prosador, com mais de 40 livros publicados.

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