Marília Pêra dirige ‘Callas’

A soprano Maria Callas (1923-1977) foi a mais gloriosa presença vocal da ópera do século 20. Sua atuação cênica e presença vocal tão peculiar jamais encontraram uma substituta à altura. Amada pelos fãs, venerada pelos críticos, Callas, no entanto, era uma mulher frágil e morreu abandonada pela própria voz, que estragara em arriscadas aventuras, e pelo amante, o grego Aristóteles Onassis, que a trocou por Jackie Kennedy, partido mais cintilante.

“É justamente esse perfil menos conhecido de Callas, a mulher delicada em busca de um grande amor, que me fascina profundamente”, comenta Marília Pêra, atriz de primeira grandeza que viveu a cantora no palco, na peça Master Class, em 1996. A paixão, no entanto, é mais antiga pois, nos anos 1980, Marília colecionou tudo que dizia respeito à soprano, como discos, livros, fotos, reportagens. Adquiriu um conhecimento tão profundo que ela se tornou a opção natural para a direção de Callas, peça que estreia nesta sexta-feira, 12, no Teatro Itália.

O espetáculo marca o retorno de Marília, de 71 anos, às atividades artísticas, depois de oito meses cuidando de um problema lombar e na perna que a deixou imobilizada. “No pior momento, cheguei a pensar que não andaria mais”, contou ela ao jornal O Estado de S.Paulo, em entrevista por telefone.

Questionada sobre como foi voltar a trabalhar com a obra de Maria Callas, Pêra conta que “foi fascinante. A peça foi escrita por Fernando Duarte, que foi camareiro da montagem de Doce Deleite, que dirigi em 1981. O texto se passa em Paris, em 15 de setembro de 1977, um dia antes da morte de Callas. Lá, ela se encontra com um dos poucos amigos que restaram, John Adams (vivido por Cássio Reis), que organiza uma exposição sobre sua vida e carreira e Callas vai dar uma última checada nos objetos. Ela já está triste, pressentindo que a morte se aproxima. Ao pensar na direção, tive a ideia de transformar em uma espécie de documentário ao vivo”.

Ela diz que “enquanto Callas observa os objetos, ela usa alguns, como os figurinos de óperas famosas. Assim, enquanto Claudia Ohana, que vive Callas, prova o vestido, três telões vão exibir cenas da própria Callas trajando o mesmo figurino, de personagens como Ana Bolena, Tosca. Assim, o público acompanha uma espécie de documentário de 62 minutos, no qual aparecem filmes, fotos e a própria voz de Callas”.

Pêra diz se identificar com Callas por ela ter sido uma cantora fantástica, encadeava notas musicais com uma lógica de atriz, mas, impressionava pela fragilidade e infortúnios no amor. “Era um monstro em cena, mas não escondia sua fraqueza pessoal. E, como sua vida era acompanhada publicamente (a imprensa noticiava tudo, sucesso e fracasso), ela se mostrava por inteiro. Callas levava muito a sério o que escreviam. Quando foi abandonada por Onassis, ela começou a morrer. Afinal, uma cantora lírica necessita que massageiem seu ego para manter a voz no lugar, o diafragma forte, e Callas, além de emagrecer, perdeu a própria confiança. Em um momento da peça, mostramos a terrível cena em que Kennedy é assassinado. Nesse instante, Claudia diz que Onassis preferiu a mulher que se tornava a mais importante do mundo”.

Pêra também contou que já comparou o destino de Callas com o de Elis Regina. “Elis também morreu cedo, também muito comprometida com o que pensavam sobre ela, uma mulher muito exposta. São almas semelhantes, frágeis, morrendo cedo e com sensação de fortaleza”.

Sobre o problema de saúde enfrentado, Pêra disse que “foram oito meses muito difíceis. Tive um desgaste ósseo na região lombar e também no quadril direito. Senti muita dor. Achei que não conseguiria mais pisar com a perna direita e já me conformava em apenas escrever. Emagreci muito – de 47 quilos fui a 40. Era um moto-contínuo: eu melhorava um pouco, fazia fisioterapia e massagem, mas piorava. Aí, vinha um repouso absoluto. Melhorava novamente, fazia fisio, massagem e novamente piorava. Até que, nos últimos três meses, decidi não mais fazer fisioterapia até melhorar completamente. Hoje, ando pra lá e pra cá, uso salto alto e até já penso em voltar à cena. Tanto que volto a gravar o programa Pé na Cova em dezembro e, no fim de setembro, vou rodar um filme chamado A Dona do Paraíso, do diretor português José João Silva”.

A história trata de uma mulher que perde um terreno no meio da Amazônia e passa a lutar para recuperar a posse. “Vou à Amazônia, enfrentar tarântulas, formigas, mosquitos (risos). Mas será um filme de aventuras, que vai comprovar que estou bem mesmo”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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