A cantora Maria Rita, uma das mais aclamadas revelações da música brasileira em 2003, chamou a atenção do “público MPB” para eles. Caetano Veloso chamou-os de “grupo inspirado e inspirador”. Marina Lima louvou o que classificou como “fusão de Noel Rosa e rock”. Lobão, que costuma atacar unanimidades, desta vez embarcou nos elogios também. Assim como Tom Zé, Frejat, Zeca Baleiro e Marisa Monte. Na internet e nos shows, como o que fizeram no TIM Festival, milhares de adolescentes engrossam o coro, numa euforia e devoção que talvez não seja vista desde os tempos de Legião Urbana. O escritor João Ximenes Braga até identificou uma tribo urbana inspirada neles, os barbudos e descolados “hermanitos”.
Com três discos lançados, a banda carioca Los Hermanos – Marcelo Camelo, Rodrigo Amarante, Rodrigo Barba e Bruno Medina – firmou-se, no ano que se acaba, como o nome mais respeitado do pop nacional. E o mais incrível, sem exibir vendagens espetaculares nem se sustentar em estratégias de marketing agressivas. “Ventura”, seu último CD, foi louvado pela crítica e, poucos dias depois de ter chegado às lojas, estava na boca de todos os fãs que lotavam o Canecão – com canções sem refrão que em nada lembravam o hit “Anna Júlia”. “Nosso caminho é a longo prazo”, disse Camelo na época do show de lançamento de “Ventura”.
A fala mostra que a banda tem consciência. Mas ela não precisou esperar tanto pelo reconhecimento. O ano começou difícil. A Abril Music, gravadora que tinha o contrato deles, acabou e deixou-os sem lar. O que parecia uma barreira para somar-se aos problemas que já estavam sendo enfrentados – “Bloco do eu sozinho”, segundo disco do grupo, teve produção tumultuada e distribuição falha – não passou de uma poeira no caminho. Pouco depois eles estavam na BMG, onde produziram “Ventura”, que até a última hora estava com o nome de “Bonança” – isso, aquela que vem depois da tempestade. Com o repertório do CD, eles chegaram a shows consagradores como os recentes do TIM Festival e da Fundição Progresso, este ao lado da banda-irmã Orquestra Imperial, da qual Amarante faz parte. Para coroar o ano, receberam da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA), o prêmio de Melhor Grupo.
No meio do caminho venturoso, apareceu o fenômeno Maria Rita. A cantora, que atraía curiosidade pelo fato de ser filha de Elis Regina e também graças ao eficiente trabalho de sua gravadora, confirmou com talento todas as expectativas positivas, trazendo com ela os Hermanos, especialmente Marcelo Camelo, que emplacou duas canções inéditas (“Santa chuva” e “Cara valente”) em seu CD. “Queria gravar sete músicas dele. Seria Maria Rita canta Marcelo Camelo”, brincou, na época do lançamento do CD.
Camelo retribuiu: “Eu me sinto lisonjeado, é maravilhoso que alguém que canta com aquela voz se disponha a cantar a minha música”, diz. “A voz dela é a janela da alma, mesmo.”
Identificados com sua geração, a banda foi regravada em 2003 pela contemporânea banda Penélope, num disco que passa pela história do rock nacional. Se, por um lado, ao longo do ano foram identificados com o popular refinado da trilha sonora de “Lisbela e o prisioneiro” (gravaram Lisbela, de Caetano Veloso e José Almino), por outro, embarcaram no popular-popular de “A Taça do mundo é nossa”, filme do Casseta & Planeta. Esse foi, sem dúvida, o ano dos Hermanos, à vontade em todas as festas de arromba da música.
