O homem que teve os pés enxutos pelos cabelos de uma mulher deve imaginar o que sentiu Jesus quando Maria Madalena assim o fez. Aos olhos de hoje, é um gesto sedutor, como havia percebido o poeta Paulo Leminski na “biografia” Jesus. Pois agora a sedutora personagem bíblica ganhou um romance em que é a protagonista: Maria Madalena – A Mulher Que Amou Jesus (Geração Editorial, 664 páginas), de Margaret George, a mesma de As Memórias de Cléopatra.
Às vésperas de mais um aniversário de Jesus, Margaret George revela a história de uma mulher que incomoda o cristianismo e desafia a compreensão da cultura ocidental. Para tanto, a pesquisa buscou todas as fontes possíveis. No Novo Testamento, Madalena é citada cinco vezes nos quatro evangelhos canônicos, aqueles que a Igreja aceita. No primeiro, Jesus a liberta da possessão por sete demônios. No segundo, decide seguir Jesus. No terceiro, assiste à crucificação. No quarto, visita a sepultura de Jesus, para ungi-lo. No quinto e último, encontra-se com Jesus ressuscitado.
Não era muita coisa – por isso a autora precisou recorrer a outras fontes, como os evangelhos apócrifos, alguns dos quais elaborados já no século III. Neles, Madalena aparece como uma figura iluminada, que possui conhecimentos espirituais especiais e por isso é respeitada por Jesus. Mas nada de descrições pessoais sobre a vida de Madalena. A partir daí, ela se torna uma lenda e passa a ser citada, com os outros discípulos, em aventuras fantásticas e locais exóticos.
Maria Madalena constitui um romance em que a protagonista teria 27 anos quando conheceu Jesus e morreu aos 90, como mártir da Igreja, quando abdica do amor ao homem por devoção ao Deus, o amor religioso. Considera a romancista: “Parti da premissa de que Jesus era um homem atraente e seria pouco natural que nenhuma de suas acompanhantes femininas desenvolvesse um afeto especial por ele. Isso ocorre com freqüência entre professores e alunos, entre mestres e discípulos. Seria estranho que não ocorressem relações desse tipo num grupo misto de homens e mulheres na flor da idade. Na verdade, seria ingenuidade pensar que não ocorressem”.
A imaginação fértil de Margaret George revela-se num outro personagem bíblico: Judas. No livro, ele comparece como pretendente ao amor de Maria Madalena, mas é rejeitado por ela. A traição de Judas teria então fundo passional? Responde a autora: “Talvez se ela o tivesse aceitado, Judas poderia ter sido um serviçal da Igreja por uns tempos. Mas isso não seria o final. Não, eu não quero dizer que a rejeição de Maria o levou a rejeitar Jesus. Ela era a última tentativa que ele tentava agarrar antes da sua queda final”.