Formigas em close carregam confetes coloridos do carnaval brasileiro para dentro do formigueiro. Catadores de lixo chineses buscam algo de valor chafurdados num lixão. Cantando rap, dançando e correndo, jovens turcos ocupam ruas da periferia de Istambul, à margem da prosperidade da cidade.
São imagens ricas em simbolismo, cada qual à sua maneira, que falam de festa, de crescimento econômico excludente, de transformações urbanísticas, e que foram escolhidas para compor a Expo 1: Rio, versão brasileira de uma exposição-debate montada em Nova York entre maio e setembro passados. A Expo 1: Nova York foi iniciativa do MoMA PS1, instituição ligada ao Museu de Arte Moderna nova-iorquino (MoMA) e focada em arte contemporânea e experimental, localizada no Queens.
A ideia era refletir sobre questões sociopolíticas prementes e relativas ao meio ambiente dentro do espaço do museu. Depois do Rio, as obras seguem pela China e Alemanha. Em cada país, uma seleção de obras diferente, com a incorporação de artistas locais e de discursos poéticos múltiplos.
“Em Nova York, depois do furacão Sandy (que afetou a Costa Leste dos EUA em outubro de 2012), era importante falar sobre a urgência representada pelo aquecimento global. Não imaginávamos Nova York tão vulnerável mais uma vez. Aqui no Brasil é diferente: vemos um país crescendo, passando por mudanças sociais, cuja população vai às ruas querendo participar”, diz Klaus Biesenbach, alemão que dirige o MoMA PS1 e que, com o curador do MoMA Hans Ulrich Obrist, concebeu a mostra itinerante.
Os dois vieram ao Rio para montar a exposição com o curador do MAM, Luiz Camillo Osorio. O espaço monumental do museu recebeu 60 obras em diferentes suportes, a maioria vídeos e fotografias, datadas das últimas quatro décadas e com distintas nacionalidades (norte-americana, turca, chinesa, alemã, húngara, sueca…)
Os artistas brasileiros são Cinthia Marcelle, Claudia Andujar, Jarbas Lopes, Jonathas de Andrade, Thiago Rocha Pitta, Rivane Neuenschwander e Cao Guimarães. Os dois últimos, mineiros da mesma geração, assinam Word/World, o vídeo que focaliza as formigas com lente de aumento.
O da também mineira Cinthia Marcelle, 475 Volver, único que integrou a Expo 1: Nova York, mostra uma retroescavadeira que desenha no solo um símbolo do infinito, retirando material de um lado para jogar no outro. Jarbas Lopes, do Rio, criou uma escultura que pensa a integração urbana pelas rodas da bicicleta – ele desenvolveu uma ciclovia aérea que atravessa toda a malha carioca.
O skyline de Nova York é visto de um ângulo inusitado nas fotografias da artista húngara Agnes Denes. Em 1982, ela plantou oito mil metros quadrados de trigo no Battery Park, a poucas quadras de Wall Street e do antigo World Trade Center. Suas fotos, com os espigões em perspectiva, dão ar rural à megalópole e suscitam discussões sobre o valor da terra, as desigualdades sociais e as relações comerciais entre os países.
Logo adiante vê-se a Torre Eiffel do norte-americano Chris Burden. No topo, estão presos dois modelos de Titanic, que “voam” em torno da escultura – a torre inquebrável, construída em 1889 para a Exposição Universal, e o navio “inafundável”, que acabou naufragando no Atlântico em 1912.
O diálogo continua na sala ocupada pela obra do britânico Steve McQueen. Ele circundou a Estátua da Liberdade de helicóptero no vídeo de sete minutos Static, que provoca no espectador sensação de enjoo crescente. A estátua parece se mover, tendo como pano de fundo diferentes paisagens de Nova York e Nova Jersey.
Do belga Peter Buggenhout, conhecido por esculturas nada agradáveis aos olhos, vieram duas peças disformes compostas por sujeira retirada de aspiradores de pó industriais.
Públicos
A Expo 1: Nova York foi vista por centenas de milhares de pessoas. Uma das obras mais comentadas era o Rain Room (Quarto da Chuva) – como só era possível a entrada de dez visitantes por vez, a fila levava até onze horas, lembra Biesenbach. O barato era ficar na chuva sem se molhar: sensores identificavam a presença humana e cessavam a ação da água.
Em funcionamento desde 1976, o PS1 tem histórico de sucesso. Aposta em novos gêneros e em artistas muitas vezes desconhecidos do público, e, ainda assim, tem forte poder de atração.
No Brasil, o desafio é formar e alargar o público de museu, além de fazer do espaço museológico um foro alternativo para discussões sobre os rumos da sociedade. Em julho, com as ruas das capitais pegando fogo por conta das manifestações, o MAM promoveu debate propondo observação de suas raízes históricas e suas ambições.
“As coisas estão mudando o tempo todo e é muito importante pensar no que acontece em lugares como Egito, China, Ucrânia. Os trabalhos falam da fragilidade das cidades, assim como são frágeis as democracias”, aponta Biesenbach.
Para o curador do MAM, o museu como laboratório tem de estar sempre aberto para o diálogo com a modernidade e ser capaz de dar ao público o que ele não está esperando. Ele destaca o fato de o MAM, de 1948 e ícone arquitetônico carioca, estar provocando essas reflexões num momento de metamorfose urbana e expectativa com a vinda da Copa do Mundo e das Olimpíadas. “Somos uma construção aberta para a cidade, com pessoas circulando em nossos vãos, movimentando-se. Nesse momento em que se começa nova etapa da história, questionamos que tipo de modernidade queremos.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.