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Malick vê a falta de conexão das pessoas como uma tragédia contemporânea

Há um culto a Terrence Malick e a seu cinema autoral, filosófico. O problema é que, cada vez mais, os filmes parecem seguir uma fórmula. De Canção em Canção é a quintessência desses momentos Malick. Em interiores de grande luxo ou em cenas abertas, na natureza, os atores executam uma espécie de dança diante da câmera. Se em interiores, os poucos objetos realçam a riqueza, os ambientes criam um sentimento de vazio. Eventualmente, você pode até perceber que as pessoas estão conversando, ou gritando, mas não se ouvem os diálogos. A fala é feita por meio de monólogos em off, por meio dos quais BV, Cook e Faye, os personagens de Ryan Gosling, Michael Fassbender e Rooney Mara expressam seus sentimentos. Nem sempre o que dizem está conectado com a imagem.

Essa ausência de conexão é a pedra de toque do cinema de Terrence Malick. Ele não quer apenas desconstruir o relato tradicional, o que seria um procedimento, digamos, estilístico. Ele quer falar da falta de conexão – das pessoas entre elas e com o mundo – como uma tragédia contemporânea. Tal é o sentido da construção dramática de De Canção em Canção. Nesse meio ‘musical’ – e o filme tem participações de figuras icônicas como Iggy Pop, Flea e Patti Smith (além de Val Kilmer, eterno Jim Morrison) -, as cenas confrontam o trio de protagonistas, mais a Rhonda de Natalie Portman, com os grandes temas do homem. O sexo, o amor, a vida, a morte. Dinheiro e fama não trazem a plenitude. BV precisa reencontrar a felicidade, deitar-se na grama, sentir sua conexão com a terra. Retorno à simplicidade ou a mais banal das mensagens?

Talvez o aspecto mais importante a ser ressaltado em De Canção em Canção diga respeito à simetria audiovisual do filme. Malick trabalha com um grande diretor de fotografia – Emmanuel Lubezki -, funde partitura e música incidental e, principalmente, trabalha com três montadores. São sempre muitos montadores e, na coletiva de Árvore da Vida, em Cannes, na ausência do diretor, atores, fotógrafo (sempre um) e montadores foram decisivos para quem tenta decifrar o mistério, ou identificar o método do cineasta. Malick trabalha com mais de um editor, separadamente, às vezes na mesma cena, para ver qual vai lhe entregar o que muitas vezes nem ele sabe ainda que quer.

O filme nasce desse movimento de desconstruir para harmonizar. Vale-se de falas enfáticas e muitas vezes grandiloquentes. BV fala da piscina na casa de Cook. Não é uma piscina – é um palco, ele retruca. O filme busca esse movimento para mais, para depois tentar convencer que não. O menos é mais importante. O simples. O autêntico. O pé na grama. Sem dúvida que é belo ver e ouvir o novo Malick, mas, como autor, ele está chegando a um ponto crítico. É tanto, para tão pouco.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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