Uma guerra paralela à Guerra no Iraque foi deflagrada pelas emissoras brasileiras. Sem poder cobrir os acontecimentos no “front” e, pior, recebendo dos governos americano e iraquiano versões suspeitas para os mesmos fatos, as tevês nacionais lançaram mão de estratégias alternativas. Apostam em coberturas que vão das análises de especialistas sobre os desdobramentos e efeitos da guerra ao puro apelo emocional. Em comum, porém, estão as imagens retransmitidas por redes como a americana CNN, a britânica BBC e a portuguesa RTP, além das representantes dos países árabes Al Jazeera e TV Iraque.
A Globo bem que tentou, mas não conseguiu mandar uma equipe para o Iraque. O jeito foi se arranjar com o repórter Marcos Uchôa no vizinho Kwait – que serve de base para as tropas americanas e acaba eventualmente sendo alvo do contra-ataque iraquiano. De lá, Uchôa usa e abusa do vídeo-fone. A novidade tecnológica é uma espécie de “kit correspondente”, com câmara acoplada a um “note book” contectado à Internet, que permite a transmissão em tempo real. É prático e tem custos baixos, mas a imagem fica tremida, sem nitidez. Com imagem perfeita, mas bem longe dos bombardeios, permanecem as equipes sediadas nos escritórios de Londres e Nova Iorque. Na verdade, não faz muita diferença, já que a imprensa mundial vem tendo acesso restrito às informações.
Se falta informação, sobra emoção na cobertura da Rede TV!. No “Repórter Cidadão”, as cenas de corpos e pessoas feridas – importadas da Al Jazeera e da TV Iraque -dominam o noticiário. No mesmo tom, o âncora Marcelo Rezende embarca no sentimentalismo. Repete inúmeras vezes a retórica sobre as vítimas inocentes dos bombardeios e acusa abertamente o presidente dos Estados Unidos, George Bush – o que as outras emissoras fazem de modo mais velado. Mas surpreende mesmo quando dedica 10 minutos do jornal a falar de outras “vítimas” da guerra: os golfinhos, usados por militares americanos para detectar minas marítimas. Nada mais “ecologicamente correto”. Só que, na ânsia de comover, o jornalista deixa subentendido que os animais morrem ao detectar as minas -quando, na verdade, elas são desarmadas por especialistas.
Para compensar a falta de informações confiáveis sobre a guerra – como alvos de bombardeios, movimentação das tropas, número de vítimas e de prisioneiros – Globo, Band e Record investem em análises e comentários de gente tecnicamente especializada, como cientistas políticos e peritos em estratégia militar. Outra saída tem sido buscar personagens como iraquianos que vivem no Brasil, famílias com parentes no Iraque e mães que têm filhos servindo numa das tropas.
Mas há também quem tenha se antecipado ao conflito. A Band, por exemplo, mandou o repórter Herbert Moraes para o Iraque no início do ano. Ele retornou semanas antes de deflagrada a guerra, com uma série de reportagens especiais. Mas não deve voltar ao local tão cedo… Da mesma forma, a Globo parece ter desistido de enviar uma equipe para o Iraque, já que os jornalistas que ainda restam por lá sofrem com o controle de informação e vigilância cerrada – seja do governo de Sadam ou dos invasores da coalizão anglo-americana.
Bem diferente da cobertura da Guerra do Golfo, porém, a Globo deixa claro sua oposição ao governo americano. No que tem sido seguida pelas outras emissoras. Mas não incorpora o discurso de nenhum dos lados, deixando evidente o desencontro de informações vindas dos Estados Unidos e do Iraque. Mais distante desse fogo cruzado, porém está o SBT, que não vai além de reportagens burocráticas dentro dos noticiários. Como também não tem muitos jornalísticos na grade, a emissora de Sílvio Santos nem mesmo se dá ao trabalho de abordar as conseqüências da guerra.
