Em Araraquara, as primas de Ignácio de Loyola Brandão se reuniam à frente de suas casas para tricotarem juntas. Mas a expectativa daquelas mulheres não era de que os trabalhos fossem terminados, relembra o escritor, jornalista e cronista. Pelo contrário. Ele conta que as jovens aguardavam o surgimento de um homem, quase um príncipe, que se casasse com uma delas e as tirasse de lá. O tempo passou e, um dia, Loyola foi visitar sua cidade natal. “Me encontrei com uma delas, estava bem velhinha e continuava tricotando”, diz. E ela comentou: “Passei a minha vida aqui, tecendo a solidão no fundo da agulha”. Foi a frase que inspirou o título para o livro de crônicas de Loyola, lançado em 2013. Ao lado da filha, a cantora Rita Gullo, o show musical Solidão no Fundo da Agulha entra em cartaz nesta terça, 10, no Teatro Eva Herz.

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Espetáculo composto pelas memórias do escritor relembra momentos marcantes de sua carreira, desde quando deixou Araraquara para tentar a vida em São Paulo. Ele conta que a música sempre esteve presente na sua vida. “Aos domingos, eu me sentava na frente do clube da cidade, do lado de fora, claro, porque eu era pobre, e ficava ouvindo tocarem o bolero Quizás, Quizás, Quizás, de Mercedes Sosa. Nesses momentos, sua imaginação fluía. Loyola imaginava as garotas dançando, os músicos e o clima daquele baile. “Eram noites quentes, as janelas do clube ficavam todas abertas e eu ficava a ouvir as canções.” Foi quando Rita percebeu que, além do livro, poderia ser interessante reunir as canções. “O repertório já estava pronto, vinha da experiência dele. Muitas das músicas não eram da minha época, então pesquisamos as originais e trabalhamos em novos arranjos”, explica a cantora, que tem o acompanhamento da viola de Edson José Alves. Junto com as canções, os locais também precisavam ser revisitados. Rita conta que esteve em Araraquara com o pai e em lugares do centro de São Paulo. “Foi gostoso passear por essas histórias.”

Outra música que movimenta as lembranças de Loyola é Amado Mio, do filme Gilda. O escritor narra, entre risos, o episódio que assistiu no filme de Charles Vidor, que colocava a atriz Rita Hayworth no papel mais ousado para um longa dos anos 1940. “Eu tinha só 12 anos e o filme era proibido para menores, pois tinha uma cena de strip-tease daquela mulher belíssima.” A carreira de jornalista também começou por causa de encontros com a música. Recém-chegado a São Paulo, e à procura de trabalho, o jovem escutou a canção de Mercedes tocar em algum lugar e passou a segui-la. “No meio do caminho, encontrei um amigo que me levou para o jornal Última Hora.”

Loyola, que antes só subia no palco como palestrante e tinha que dissertar sobre teorias da literatura, agora diz que está se acostumando com a experiência de ser intérprete da própria história. “Já me sinto um ator”, ele brinca, enquanto Rita afirma que o pai é uma fera no palco. São tantas histórias, ele confessa que, por vezes, algumas são contadas de maneira diferente. “Mudo alguma coisa ou acontece de esquecer, mesmo. De qualquer forma, é a oportunidade de lembrar algumas histórias e fazer uma revisão de vida.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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