Longa ‘Trampolim do Forte’ destaca vida de garotos

Foi um longo caminho para chegar aos cinemas – Trampolim do Forte, de João Rodrigo Mattos, ilustra bem as dificuldades que afligem a produção nacional. O filme é de 2010 e demorou quatro anos – quatro! – para estrear. No intervalo, estreou em 2011 outro filme que tem alguma similaridade com o de Mattos. Capitães de Areia, que Cecília Amado, neta de Jorge, adaptou do romance de avô, conta a história de Pedro Bala, que se coloca à frente de um grupo de meninos de rua de Salvador. Pedro Bala pega em armas num determinado momento para se afirmar perante a adversidade do mundo que o cerca, como Deo, o garoto de Trampolim do Forte, também precisa se armar contra o estuprador de menores que ronda o trapiche.

E a similaridade não para aí. Ambos os filmes fundem musicalidade e erotismo como temperos da realidade baiana. E chega – Capitães não foi referência para Mattos. Trampolim é um filme contemporâneo em que o diretor quer refletir sobre a exploração do trabalho infantil (definição dele). Capitães é de época e mais ligado à violência criminal. Trampolim trata de dois garotos – Deo e Felizardo. O primeiro é abandonado pela mãe e integra-se ao grupo que faz do trampolim da Barra o seu point. Ali convergem marginais e pequenos criminosos, aliciadores de garotas de programa, travestis. O amigo de Deo é Felizardo, cuja mãe entrega ao pastor a féria que ele dá duro para levantar vendendo picolé na praia.

É interessante como ambos os filmes constroem uma ética da camaradagem. É o que une as crianças mesmo quando tudo parece perdido – Felizardo, o bom menino, pressionado por outro garoto da rua, integra esquema de roubo de carteiras. A mãe – Marcélia Cartaxo – descobre, mas não tem moral para cobrar o que quer que seja do filho, que a surpreende em intimidade com o ‘reverendo’. E mais revelações vão surgir sobre esse personagem. Mattos termina seu filme numa aurora carregada de esperança, mesmo depois que Deo disparou seu revólver contra ‘Tadeu’, o estuprador de menores do trampolim. Embora a função da arte não seja resolver problemas, o diretor não queria terminar seu filme num buraco negro.

No começo e no fim, o trampolim chama os garotos e eles se atiram na água como quem foge dos problemas – em busca de lazer (purificação?). São belas cenas, poéticas, mas o diretor Mattos repete tanto um recurso – as gotas d’água na lente, com seus reflexos de luz – que estetiza a imagem. Seria o caso de retomar a discussão de Ivana Bentes sobre a cosmética da fome, que tanta polêmica provocou no cinema brasileiro a partir de Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, em 2002. O curioso, informa o diretor, é que Ivana virou defensora de seu filme, quando Trampolim passou na Première Brasil do Festival do Rio de 2010.

Mais até do que a cosmética da fome, a herança de Cidade de Deus talvez seja outra. Muitos críticos têm discutido o papel do preparador de elenco, responsável pelo surto verista das interpretações na última década no cinema brasileiro. João Rodrigo Mattos recorreu a essa figura polêmica. Ele selecionou Lúcio Lima (Deo) e Adailson dos Santos (Felizardo) entre mais de 400 garotos. O grupo foi sendo reduzido para 45, para 14 (os que estão no filme). E o teste de Adailson, só para sua informação, foi o de número 001. Ambos os garotos são muito bons. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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