Cinema

Longa ‘Coração de Leão’ trata de preconceito com humor

A atriz argentina Julieta Díaz resume de forma simples a questão principal de “Coração de Leão – O Amor não Tem Tamanho”, que estreia nesta quinta-feira, 19. “É uma comédia romântica com todos os ingredientes típicos. A diferença é que o herói mede 1,36 metro e nisso está todo o conflito. Algo tão pequeno e grande ao mesmo tempo”, diz ela, que vive Ivana, a heroína desta trama improvável, mas muito verossímil.

Para atuar ao lado do ator argentino Guillermo Francella (León, o pequeno herói da trama), Julieta teve de aprender a falar olhando para baixo e contracenar com um fundo verde. Já para Francella, um dos mais prestigiados atores de sua geração, o desafio foi ainda maior.

O ator conta que não foi fácil aprender a, além de atuar olhando para cima, passar grande parte do tempo também atuando sozinho em um estúdio verde, aprender a lidar com as proporções dos objetos de forma diferente e a não olhar nos olhos dos seus interlocutores. Mas todo o esforço valeu a pena.

A história de amor entre uma advogada e um arquiteto ‘quase’ anão emociona. “Há 15 anos quero contar esta história, mas não havia tecnologia na Argentina para fazê-lo”, conta o diretor Marcos Carnevale. “O filme coloca um espelho diante de nós. E percebemos que todos temos preconceito. Não só com os outros, mas com nós mesmos.”

Mais que colocar um espelho diante do público, que se surpreende encarando os próprios preconceitos, Carnevale constrói um diálogo sobre o quão infeliz nos tornamos simplesmente por temer o que a sociedade vai achar de nossas escolhas e preferências.

Mas em vez de fazê-lo em cenas dramáticas, Carnevale cria momentos tragicômicos, que revelam o ridículo e o cômico de nossos preconceitos de cada dia. Em “Coração de Leão”, o diretor o faz ao contar a história de León e Ivana. Ele é um arquiteto famoso, bem-sucedido, que um dia, ao ver Ivana arremessar seu celular na grama de um parque, guarda-o para devolvê-lo em seguida. Ele busca a palavra ‘Casa’ na agenda do telefone e liga para ela, na tentativa de combinar um jantar para devolver o aparelho e, claro, conhecê-la. A partir daí, uma sequência simples, mas surpreendente, se segue.

Uma das cenas mais tensas, e ao mesmo tempo leve, é a que, durante uma discussão, Ivana pergunta a León: “Onde você sente mais dor?”. E ele responde, de olhos marejados: “No pescoço”, em gesto que mostra o quão doloroso, mas cômico, pode ser viver olhando sempre para cima.

Egresso do mercado de filmes publicitários, Carnevale traz o apreço por planos muito bem construídos e por um roteiro que prima, mais que pelos efeitos especiais, por diálogos bem trabalhados e histórias comuns, mas universais. Foi assim que seus filmes anteriores, “Elsa & Fred – Um Amor de Paixão” (2006) e “Viúvas” (2011), ganharam atenção mundial. “Coração de Leão” chega ao Brasil com um belo cartão de visitas. Na Argentina, já foi visto por 1,7 milhão de pessoas e é a segunda melhor estreia do país.

Vale lembrar que a película é uma coprodução entre Brasil e Argentina e tem cenas rodadas no Rio. O produtor do filme no País é o ator argentino naturalizado brasileiro Mário José Paz (o Maradona, de “Viver a Vida”), que faz também uma ponta no filme.

De volta à trama, Carnevale afirma que sempre tenta abrir a consciência das pessoas, trazer um novo olhar. “Sem ser pretensioso, falar de assuntos que têm a ver com a educação, aliás, com a má educação, que nos dão.”

Por má educação, entenda-se o preconceito, as receitas prontas para viver e a preocupação exagerada com o que a sociedade pensa. “As pessoas deveriam viver como elas querem, como sonham. Mas fazem o que ‘devem fazer’ e ficam infelizes”, completa.

Mas como negar que, diante do amor de uma bela mulher por um rapaz extremamente baixo que, como diz o personagem León, é um homem completo só que com um pequeno problema de crescimento, a primeira reação é de surpresa e estranhamento? “O que acontece quando nos envolvemos com alguém fora dos padrões? Ivana é linda, advogada de sucesso. León também é bem-sucedido, gentil, bonito… Mas tem 1,36 m. O que pensam os outros? O que pensamos nós mesmos? Devíamos dizer: Não me importa! Mas não é assim na realidade”, comentou Francella durante o lançamento do filme na Argentina.

É a discussão sobre se importar ou não que rende um dos momentos mais emocionantes do filme. Toto (Nicolás Francella, filho de Guillermo na ficção e na vida real) diz ao pai: “Nunca me importei na escola, quando meus amigos comentavam sobre você. Porque sabia que não se importava”.

É o pai que dá força ao filho. Mas quando ela falta, o tamanho vira documento. “Pois me importo. Quando todos cresciam por fora, eu crescia dentro. Mas estou cansado de ser baixo”, responde o pai.

É a interação entre pai e filho que contribuiu muito para que o roteiro fluísse no filme em que a ação direta foi todo o tempo interrompida por operações de efeitos visuais. “Muitas vezes, eles atuavam separadamente e a cena se completava na pós-produção. Era a estreia de Nicolás no cinema. Ter pai e filho tão amigos, tão entrosados, que já ensaiavam em casa e chegavam ao set prontos e criando situações, foi ótimo”, diz o diretor.

Sobre os efeitos visuais, Francella declarou: “Gosto muito da originalidade do projeto. Mas foi um desafio atuar com tantos fatores técnicos. Até mesmo minha postura teve de mudar”.

Foram os fatores técnicos que possibilitaram que a ideia virasse filme. Para que Francella, que tem estatura normal, ficasse pequeno na tela, houve muitos preparativos no set, do fundo verde a ajuste de objetos. Na pós-produção, que levou quatro meses e ficou a cargo de Juan Pablo Pires, a figura de León era recortada, diminuída digitalmente e sobreposta a imagens rodadas separadamente. O resultado é único. “Quando a gente vê o filme pronto, sente que valeu a pena.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

CORAÇÃO DE LEÃO – O AMOR NÃO TEM TAMANHO

Direção: Marcos Carnevale. Gênero: Comédia (Arg-Br/2013, 100 min.). Classificação: 12 anos.

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