Dizer que À Queima-roupa (Point Blank), de John Boorman, é um dos mais fortes filmes do gênero policial não basta para qualificá-lo. Será preciso ajuntar que o inglês Boorman trouxe consigo influências europeias notórias e as emprega para dar um impacto ainda maior a esta história de amor, crime e vingança.
Baseado no livro de Richard Stark, The Hunter (O Caçador), tem em Lee Marvin (Walker) o assaltante que, dado como morto, sai atrás do amigo que o traiu em parceria com sua mulher, Lynne (Sharon Acker). No percurso, entra em cena a fatal Chris (Angie Dickinson).
À sua época, o filme foi tido como de extrema violência. E, de fato, Boorman não é de economizar tempero em suas receitas – ver, por exemplo, Inferno no Pacífico ou Amargo Pesadelo. Mas é uma violência de conteúdo, ou seja, dramaticamente justificada e não espetacularizada. Além disso, em À Queima-roupa, Boorman procede com saltos no tempo e uma profunda sensação de estranhamento, que passa do personagem para o espectador. É como se estivéssemos vendo um filme da nouvelle vague, porém com conteúdo norte-americano.
O resultado é poderoso. Numa narrativa sintética, Boorman consegue fazer de Walker o caminhante por um mundo que lhe é estranho e, a cada passo, mais incompreensível. No fundo, é um pequeno ladrão, num mundo de grandes bandidos. Malandros profissionais, diria Chico Buarque.
Por falar nisso, é curiosa a relação de Boorman com o Brasil. Em À Queima-roupa há um personagem que diz em português que “Deus é brasileiro”, e, em seguida, traduz o significado para um parceiro. Em 1985, Boorman veio à Amazônia filmar A Floresta das Esmeraldas, e descobriu para o elenco uma garota paraense muito talentosa. Ninguém menos que Dira Paes.