Livro de Pellegrini ganhou o Prêmio Jabuti de 2001

Ao empurrarmos o pesado portão da chácara nos deparamos com pequenos arbustos que teimam em segurá-lo. Um breve olhar para a jabuticabeira carregada, enquanto um pássaro grita de lá: bem-te-vi! Por certo, não há como fazer nada às escondidas, há espiões por todos os cantos, mesmo neste lugar tão supostamente distante. Aqui há um mistério e, a chuva que se inicia, convida ao recolhimento lá na varanda onde podemos aguardar pela noite sentados em uma poltrona de lona.

É pertinente afirmar que estes são sintomas pós-leitura do romance O caso da Chácara Chão de Domingos Pellegrini, pois quem vai à chácara leva algum tempo para retornar. Assim, estando por aqui, principiamos o exercício da escrita. Sobre a chácara? Sim, porque daqui podemos observar seus muros e as touceiras de primavera.

Este romance, publicado em 2000 e que ganhou o Prêmio Jabuti no ano de 2001, apresenta um painel bastante interessante sobre a validade de nossos princípios e sonhos. Ou seja, é na busca por um lugar simples e acolhedor que o casal Olga e Manfredini (ele escritor), com sua filha Verali, passam a viver em uma chácara na periferia da cidade. Posteriormente, Paulinho, o filho problemático de Olga, junta-se ao grupo.

No entanto, o sossego antes pretendido dá lugar a uma série de acontecimentos causados por um assalto em pleno domingo de Carnaval. Significando que a paz e a realização representadas por um pequeno pedaço de terra têm seus fundamentos abalados por aquele ato de invasão.

Isto é, o assalto vai resgatar estas personagens, tão aninhadas com a rotina inebriante da chácara, para as garras das instituições corruptas e ameaçadoras, que se constituem e crescem na cidade. Percebe-se então o desejo incontido destes em retornar sempre àquele lugar perfeitamente sagrado; seja dia ou noite, faça sol ou chuva.

A imposição do espaço da chácara em relação à cidade do outro lado do muro se constitui num prenúncio de escolha do narrador, que já determinou ser este o mais favorável aos personagens que ora dirige. Entretanto, com o assalto e suas repercussões, a cidade vai ampliar seu domínio com a intenção de corromper também aquele recanto anteriormente esquecido. Demonstrando que seus flexíveis galhos de trepadeira possuem espinhos doloridos.

Certamente que esta é uma das inúmeras surpresas do livro. Mas é preciso ter calma. Devagar com o andor, que ainda há sinal de chuva. É muito bom aguardar aqui mesmo pelo fim da história. Veja com seus próprios olhos e folheie com suas próprias mãos. O que aconteceu com os moradores da chácara? Não vou contar, porque ainda estou investigando, página após página. Afinal de contas foi por isso que voltei à chácara e, retornar ao local do crime, como todo mundo sabe, supõe culpa ou displicente cumplicidade.

O caso da Chácara Chão -Domingos Pellegrini. Editora Record – 4.ª edição 2006.

Maria Helena de Moura Arias é jornalista, trabalha da Editora da UEL  e é doutoranda em Letras pela Unesp-Assis/SP.

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